quinta-feira, 27 de setembro de 2012

JANELAS DO TEMPO: MOSQUEIRO, APOLLO 11 E A MÁGICA.

Autor: Carlos Barretto

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Mosqueiro, 21 de julho de 1969.

Era mais uma manhã ensolarada de inverno amazônico.

Eu era apenas um tímido moleque de apenas 7 anos. Para minha alegria, os vizinhos habituais do Murubira estavam presentes com seus filhos. Eles eram a minha garantia de diversão nas férias escolares de julho. Vanvan, Carol, Avany, Tatá, Pinga, Cilinha, Tony, Ruizinho, entre tantos outros que se somavam para curtir a praia, bater uma bolinha e, à noite, brincar de "Cai-no-poço", "Pó, Ruge e baton", "Pira", "Esconde-esconde", etc. Ou então, em momentos algo mais reflexivos, olhar para o céu noturno e arrepiar os cabelos com histórias e suposições sobre outros planetas e extraterrestres, as enormes distâncias que nos separavam deles, e admirar a lua, sua beleza e seus mistérios.

Gorducho, retraído e criado em ambiente de rígida moralidade cristã, era mais ingênuo que a média das crianças de mesma idade. Claro que era alvo preferencial de inevitáveis "encarnações" que acabava absorvendo com naturalidade. Na época, nem existia o termo bulliyng da atualidade (muito embora a prática nefasta já existisse epidemicamente nas escolas e outros ambientes). Contudo, por alguma razão, nunca senti nada próximo a qualquer tipo de sofrimento com aquela turma querida. Era algo que rolava numa boa, sempre entremeado com manifestações de respeito e amizade, que terminavam por amenizar tudo.

Já encarava as primeiras paixões platônicas pelas garotas superhipermega lindas da turma. Uma tremenda ousadia para um gordinho com péssima autoestima. Daquelas que você em algum momento pensa: "te manca e vai procurar alguém pro teu bico, rapá!". De fato, somente bem mais adiante, já aos 15 anos, eu iria dar meu primeiro beijo na linda menina que nunca mais iria ver. Foi apenas uma noite e fim! Foi inaugurada então a primeira "ficada" da minha vida. 

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Petromax

A ilha - que na época, mesmo em "alta temporada" ainda podia se chamar bucólica - estava com movimento acima do normal. Mesmo movimentada, não se via a barbárie que se vê hoje. Os poucos postes de iluminação pública existentes (ainda em madeira), geravam apenas um pequeno e tênue halo de luz amarelada logo abaixo. A energia elétrica fornecida por um gerador público só funcionava até às 22 h. Depois dessa hora, só velas, toscos candeeiros de querosene ou os modernos (e importados)"Petromax" das residências forneciam o mínimo de luz para as necessidades básicas. Dormia-se bem cedo. Nas praias e ruas, reinava a escuridão absoluta. Esta discutível precariedade, na verdade seria a responsável por uma das minhas mais belas lembranças de infância. Ela deu à todos o presente mais difícil de encontrar nos dias atuais: o céu mais estrelado que pude ver em toda minha vida.

Neste cenário, há exatos 43 anos atrás, uma pequena televisão ADMIRAL de 14 polegadas em preto e branco, conectada a um tosco "regulador de voltagem" e a uma indispensável antena externa, mostraria precisamente as imagens abaixo:

Olhava para aquilo tudo e não conseguia disfarçar minha excitação infantil. Aquele instante mágico, de alguma maneira, era também a realização de um sonho pessoal. A família toda reunida em torno daquelas 14 polegadas, não dava uma palavra. Estavam todos encantados!

Meu pai esforçava-se para responder todas as perguntas que fazíamos. Eram muitas. Eu já me incomodava com o fato de que havia um grande atraso entre o fato e a imagem que nos chegava. Indignado eu pensava: "sacanagem! Isso tudo já aconteceu e só agora estamos vendo"! Mal entendia o empenho tecnológico necessário para que aquelas imagens desfocadas e atrasadas chegassem aos mais variados e distantes rincões do mundo.

Se não me falha a memória, a transmissão iniciou por volta da hora do almoço. As famílias estavam todas em casa. Poucos possuíam televisão no país. Menos ainda na agradável ilha. Talvez muitos nem tenham tomado conhecimento da façanha. Pude comprovar isso cerca de 5 anos mais tarde.
Aficcionado do plastimodelismo, montei um kit da
Revell que constava de: 1 foguete Saturno, a cápsula Apollo 11 e o módulo lunar. Uma maravilha que montei com esmero e deixei em exposição no enorme quarto que dividia com meus três irmãos. O brinquedo não escapou da curiosidade de Antonio, filho da empregada de minha mãe.

Oriundo da cidade de Igarapé-Miri e apenas 1 ano mais velho que eu, ele tinha o típico perfil de caboclinho amazônico. Brincávamos muito enquanto sua mãe trabalhava. Um dia ele me perguntou sobre "aquela coisa". Espantado com a pergunta, com toda a paciência, descrevi todos os detalhes da missão Apollo 11, indicando o papel de cada um daqueles elementos. Para minha surpresa (e posterior indignação), ele simplesmente não acreditava!!

Desafiado, na sequência emprestei-lhe então uma edição especial da revista Veja (que guardo até hoje) dedicada a então designada "corrida espacial". Ricamente encadernada e ILUSTRADA. Não adiantou! Para minha absoluta irritação, ele não tirava da cara um riso maroto, (que tenho dificuldade em descrever). Mas, em síntese, eu traduziria aquele riso assim:

“Esse  almofadinha cara pensa que vai me enganar"?

FONTE: http://blogflanar.blogspot.com.br/2012/07/mosqueiro-apollo-11-e-magica.html

O autor: Carlos Barretto

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Médico formado pela UFPA em 1988, especializado em Medicina Intensiva em 1994 e fotógrafo amador nas horas vagas. Possuo 2 sintetizadores eletrônicos com os quais, faço minhas incursões amadoras no mundo da música. Confesso que me sobra pouco tempo para brincar com eles. Mas gosto de vê-los aqui e usá-los para alguns períodos de puro relaxamento aliviando as tensões de minha atividade profissional. Sou um entusiasta de informática, com enfoque em hardware. Hoje possuo um Mac e não tenho saudades do Windows e seus problemas. No mais, confesso-me um viajante contumaz. Mas daqueles que mete o pé na estrada e ainda usa uma mochila nas costas, se necessário for. Trabalho para educar os filhos e viajar. Sou Mosqueirense de coração e alma.

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