quinta-feira, 21 de outubro de 2010

NA ROTA DO TURISMO: “Um pedaço da Europa na Amazônia”

Autora: Juliana Oliveira

Construídos para serem recantos paradisíacos de férias, os casarões Mosqueirenses são um marco na história paraense.

Na passagem do século XIX para o século XX a Europa seguia frenética o curso do desenvolvimento industrial. Em Belém do Pará, os barões da borracha pareciam respirar os mesmos ares europeus, proporcionando à capital paraense uma época de luxo, ostentação e busca pela modernidade.

Outros centros urbanos da Amazônia também viveram esse período de progresso nos anos de apogeu da borracha, entre 1880 e 1912. Mas, no Pará, essa euforia trouxe desdobramentos para a ilha de Mosqueiro, conhecida, até então, por auxiliar no abastecimento de Belém.

Os impactos em Mosqueiro chegaram nas bagagens dos europeus. Eles aportaram na Amazônia para trabalhar na urbanização de Belém e de outras capitais da região. De acordo com o historiador Augusto Meira Filho, autor do livro “Mosqueiro Ilhas e Vilas”, esses estrangeiros descobriram rara beleza no arquipélago. O clima já exótico da região foi acentuado pela visão das praias de água doce.

A ilha tornou-se o local predileto para os Lochard, os Ponted, os Smith, os Upton, os Kaulffus, os Arouch, além de outras famílias. No princípio, elas utilizavam embarcações particulares para chegar à ilha e, posteriormente, com a implantação de uma linha regular de transporte fluvial, no começo do século XX, construíram residências para passarem os finais de semana. Famílias abastadas de Belém logo aderiram ao movimento.

Casarões – Nesse período, alguns proprietários de residências na orla construíram trapiches particulares. Assim surgiu a denominação “porto-chalé” como o “Porto Arthur” e “Porto Franco”. As encomendas chegavam com mais conforto às residências. Os próprios pescadores da ilha iam vender peixes na porta das casas, antes mesmo de seguir para o mercado.

Para o professor da Universidade Federal do Pará (UFPA) e arquiteto, Milton Monte, estudioso da arquitetura daquela região e apaixonado confesso pela ilha, os casarões da orla mosqueirense representam raros exemplares arquitetônicos. Os prédios foram construídos mesclando estilos europeus com a realidade climática local, tendo porões habitáveis ou não, feitos em função da salubridade e ventilação.

Monte, que apresentou como trabalho de conclusão de curso em arquitetura uma tese sobre a edificação dessas casas em Mosqueiro, lembra que a construção de casarões por europeus aconteceu em vários pontos da Amazônia. Em Icoaraci, também distrito de Belém, há construções similares, como o chalé da família Tavares Cardoso.

Milton, acreano e autor do projeto do pórtico da entrada de Mosqueiro, conta que, no estado onde nasceu, é possível identificá-las, mas em menor escala. Entretanto, para ele isso não minimiza a importância histórica e arquitetônica das edificações da ilha. “Apesar de terem sido construídas em outros pontos da região, a ilha é o local com maior número de casarões e, por isso, apresenta maior diversificação. Dessa forma, a arquitetura se torna singular entre estilos tão distintos. O chalé Canto do Sabiá, por exemplo, recebeu influência da arquitetura eclética alemã”, comenta.

Em outros casos, é mais difícil fazer essa identificação de estilos, como o chalé Porto Arthur. Para o professor Milton, “o crédito dessas construções é dos grupos de marceneiros e carpinteiros trazidos da Europa para trabalhar na região amazônica”, explica. Esses construtores adotavam os estilos com os quais tinham contato na Europa.

Mais estudos

Apesar desse movimento de veraneio ter aumentado expressivamente com a chegada dos europeus à ilha, há quem defenda que na primeira metade do século XIX, o Pará apresentava propriedades rurais com características observadas nos casarões de Mosqueiro. O professor da UFPA, Eduardo Brandão, um dos defensores dessa tese, afirma que ainda são necessários mais estudos referentes a dois aspectos dentro dessa temática.

“A primeira é a existência de propriedades rurais em Mosqueiro no século XVIII e no início do século XIX, pois há relatos desse período descrevendo essas edificações. O outro ponto é sobre o uso delas como residências de férias, já que no início do século XIX era possível encontrar em Mosqueiro e em outras áreas rurais do Estado, edificações que apresentavam algumas características desses casarões, eram as rocinhas, as chácaras e os sítios. Antes da Cabanagem, elas serviam de residências para seus proprietários e depois, por questões de segurança, passaram a ser freqüentadas com o propósito de lazer”, argumenta Brandão.

O professor Milton Monte relata com pesar que belos exemplares dos casarões estão sendo demolidos ou se deteriorando pela falta de cuidados. Segundo ele, é um prejuízo irreparável para a história da ilha. Ainda há casos em que, apesar de não demolidos, estão abandonados, como a Casa Cacela, na praia do Bispo, onde o ex-prefeito de Belém, Alcindo Cacela, passava os finais de semana. Monte conta que já contribuiu – e ainda contribui –na arquitetura da ilha. “Gostaria que os setores competentes fizessem mais, para que esse patrimônio não se perca”, desabafa. Além do pórtico, o arquiteto projetou edificações em madeira adaptadas ao clima local, algumas com quase quarenta anos.”

(Oliveira, Juliana- “Um pedaço da Europa na Amazônia” in __ Revista Ilhas Amazônicas: o arquipélago de Mosqueiro – parte 1, Ed. 01, JAN 2006)

CASARÕES: RETRATOS DA NOSSA HISTÓRIA

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Vivenda do Cel. Motta (1907) já demolida (Fonte: A. M. Filho -1978).

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Vivenda antiga restaurada (FOTO: Gerlei Agrassar – 2010).

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O Canto do Sabiá (FOTO: Gerlei Agrassar – 2010).

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Patrimônio ameaçado (FOTO: Gerlei Agrassar – 2010).

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BAR ELITE: réplica de um prédio parisiense (FONTE: Feio – 2009).

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PORTAL DO MOSQUEIRO: O arquiteto Milton Monte inspirou-se nos

antigos Chalés da ilha. (FOTO: Wanja Janayna – 2010).

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