segunda-feira, 1 de outubro de 2012

JANELAS DO TEMPO: MACEDÃO E OS VELHOS TEMPOS DO ARIRAMBA

Autor: Augusto Meira Filho

No “Retiro IBI” de sua propriedade, adquirido de um velho lusitano precursor no lugar, o ilustre e caridoso médico Dr. José Mariano Cavaleiro de Macedo fez a sua segunda tenda de vida e de trabalho. Mosqueirense de “quatro costados” amava sua ilha e deixava-se ficar encantado no seu Ariramba, sem perder qualquer fim-de-semana e algumas folgas, quando seus trabalhos em Belém no Instituto Médico Legal e em outras atividades profissionais o permitiam. Na sua vivenda altaneira, de porão alto, em madeira de lei, o Macedão – nome decorrente de seu corpanzil – pontificava entre os nativos, ajudando-os de todas as formas e fixara em sua casa o centro social do bairro. Amava aquele Ariramba como ninguém. Freguês do Antônio no Ponto Certo e do João Vicente Lima (O Manteiga) próximo ao seu IBI, Macedão reunia aos sábados e domingos a fina flor da elite arirambense e outros convidados de lugares mais distantes.

Ficara famoso pela excelência do “aperitivo” que sabia preparar com maestria, dando-se ao luxo, muitas vezes, de exigir frutas especiais para uma aguardente de primeira ordem que recebia em botijões de amigos e clientes. Uma personalidade curiosa do eminente médico e a do mosqueirense simples, amigo da gente humilde do Mosqueiro, prestativo e generoso, dando de tudo de si para atender qualquer caso, mesmo nos pontos mais distantes, no Carananduba, no São Francisco, no Sucurijuquara, na Baía do Sol. Ele porfiava com Oswaldo Medrado nessa caridade coletiva prestada aos habitantes da Ilha naquelas lonjuras da Vila propriamente dita.

Grupos e mais grupos se formavam em sua casa, no barranco fronteiro, na praia para desfrutarem do ambiente feliz que reinava em torno do Macedão, saboreando o mais notável aperitivo do bairro. Juntavam-se ali, prazerosamente, os Fontes, os Azevedo, os Bisi, os Andrade, os Santos, os Costa, os Machado, os Bentes, os Leite. Famílias inteiras, tradicionais, do “bairro alto” comungavam da festa que culminava numa alegria coletiva, secando bojões e bojões do aperitivo sortido e delicioso do grande Macedão. O Ariramba, realmente, reunia clãs antigos e respeitáveis, velhos admiradores do local e que não o trocavam por qualquer outro na Ilha, mesmo com os que se gabavam de estar mais perto da Vila, da ponte, do navio, do mercado, etc. A verdade é que, hoje, pela estrada, são os primeiros beneficiados. E merecem!

Além do antigo e conhecido Colégio de Santa Catarina, retiro das Irmãs da mesma Ordem, residiam no Ariramba muitas famílias tradicionais vinculadas àquele recanto admirável do Mosqueiro. Os Chalets famosos dos Sarmento, dos Lobo, de dona Alzira, o “Vergel” de dona Flor (Florzinha), dos Pereira dos Santos, dos Dawer, dos Machado, dos Leite são memoráveis vivendas que povoaram o Ariramba quando Mosqueiro era somente servido do vapor Almirante Alexandrino. Pela dificuldade de transporte, precariedade nos serviços de ônibus entre a Vila e aquele ponto do Mosqueiro, realmente, tempo houve em que era uma temeridade residir-se tão longe da Vila que, por si só, centralizava toda a vida da Ilha. Passageiro do barco da Companhia, dependendo dos veículos da Prefeitura para chegar em casa, não só seria o último a desembarcar em sua residência depois de haver sofrido duras penas na viagem trôpega da viatura sempre defeituosa, como, na recíproca, era o primeiro a despertar, pela madrugada, para tomar o transporte que cedíssimo passava pela estrada apanhando a gente mal-dormida que se dirigia à capital. Por isso, dizemos com propriedade, era uma verdadeira temeridade edificar ou adquirir uma vivenda no Ariramba. Por isso, também, heróis, os que suportaram tantos anos essa adversidade e não se afastaram um só momento da brisa amena e da paisagem gostosa, que os barrancos do Ariramba proporcionam aos seus olhos. Há que se exaltar os que viveram ali ao tempo em que Mosqueiro vivia insulada, dependendo, inteiramente, do navio da linha. E o nosso Macedão liderou esse grupo de abnegados que agora desfruta das vantagens proporcionadas pela nova rodovia.

No Farol, durante algum tempo, exerceu um poder catalisador da boemia e adeptos da delícia regional dos preparados, das batidas, o odontólogo Jairo Barata. Um médico, no Ariramba; um dentista, no Farol, irmanados pela mesma simpatia e a mesma habilidade nessa química dos aperitivos à base de aguardente. A residência de Jairo, no Farol, teria a função paralela daquela do Ariramba a cargo do bom Macedão. Dizem que, um dia, encontram-se os dois, acidentalmente, no retiro do primeiro. Um dia amargo, sem banho de maré cheia, sem reserva de frutas e somente um resto de carne estava à disposição dos dois. Macedão correu à despensa sempre farta de cítricos, mel de abelha, chocolate, baunilha e outros ingredientes, estava seca, dolorosamente sem condições de atender à afamada técnica de ambos na elaboração das suas famosas “biritas”. E, na falta do material essencial ao preparo de uma boa batida, não tiveram dúvidas: adicionaram à caninha açúcar com pasta de dente, em quantidades próprias. Bateram o caldo, sacudiram a mistura e, espumosa, perfumada, foi servida à moda alemã, isto é, beber de um só gole! Assim firmou-se uma nova fórmula, privativa do Ariramba e em homenagem ao outro craque do Farol. Jairo ficou na história e foi um doloroso acontecimento sua morte, vítima de um trágico acidente. Macedão, no Ariramba, é figura legendária. Ganhou seu nome numa rua e é sempre lembrado.

FONTE: MEIRA FILHO, Augusto. “Mosqueiro Ilhas e Vilas”- ED. GRAFISA, 1978- pp. 429, 430 e 433.

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