Ainda em criança, na década de 1950, via com fascínio a praia do Bispo, recanto encantado de cuja solidão pareciam brotar reminiscências históricas e lendárias.
Se em noites enluaradas um padre sem cabeça vagava pela praia, castigo de uma paixão proibida, e o rei e a rainha, as pedras encantadas, assombravam pescadores, ainda era possível ouvir a tropelia dos cabanos na guerra de 1836, testemunhada pelo canhão descoberto sob as areias, pelo vaivém das marés, às proximidades do trapiche, e que hoje, apontando silencioso para a baía, parece defender a ilha do ataque de invisíveis navios legalistas.
Como esquecer que os primeiros banhistas ali buscavam o seu lazer de fim- de-semana e que Alcindo Cacela mandara construir, em 1936, para proteger os barrancos, um forte quebra-mar, ladeiras e bonitas escadarias ladeadas de jambeiros e encimadas por um florido caramanchão, janela aberta para o rio-mar? Ou a imponente vivenda Canto do Sabiá, cuja arquitetura alemã parecia denunciar misteriosos túneis submersos ou contatos radiofônicos com submarinos e navios inimigos, na guerra de 45?
A praia tem histórias e estórias. Quem se lembra da imagem de São Pedro no pedestal erigido, em 1962, na ilhota do mesmo nome, pelo Sr. Waldemar Almeida, a qual foi destruída pelas marés? Ou do trampolim em armação de ferro, na década de 30? Ou da construção da Quadra Dr. Irawaldir Rocha, nos anos 60, pelo Bom Jardim, o primeiro time de vôlei da ilha, no qual pontificaram as figuras de Wolckmer e Beto Tabosa, Cheiro, Espanha, Raimundo Paixão, Pedrinho e José Ângelo?
Nessa mesma quadra, os professores Firmino Melo, Carmen Dolores de Freitas Jorge e eu realizamos, em 1972, o primeiro torneio de futsal na ilha, cujo campeão foi o time da Ponte Preta. Outros times ali fizeram jogos memoráveis: o CLUJOSA do Colégio Nossa Senhora do Ó; o ÁGUA VERDE, do Fausto Ribeiro; o SAC, do Caíta; o TIME NEGRA da família Pombo; o JUVENTUS, do Carlos Mathias; o CHAPÉU VIRADO, do Toninho Russo e o BR-3, do João Maracujá, além do 5 ESTRELINHAS e do 5 ESTRELAS R.C., do eterno presidente Tertuliano, clube que se destacou como campeão paraense da primeira divisão. E, ainda na década de 70, nesse mesmo local, nascia o futebol feminino com a participação de várias equipes. Foi uma época de grande movimentação, em que os peladeiros se revezavam em disputas nessa quadra, nas horas de banho, e a moçada, nos fins-de-semana, curtia a MPB no Empata’s Phodas Bar, a seresta do Pamplona no saudoso Tabosão ou os petiscos do Ki-Caranguejo. Festas e torneios atraiam um grande e animado público para a praia do Bispo. Muita coisa mudou com o passar dos anos, mas o barranco, avançando para o rio, com sua exuberante vegetação e rochas negras carcomidas pelas águas, continua sendo um belíssimo cartão-postal, capaz de despertar os instintos e fazer nascerem muitas paixões.
Praia do Bispo, recanto de histórias e estórias (FOTO: Wanzeller, 2011).
Quadra de Esportes Dr. Irawaldir Rocha, no Bispo (FOTO: Wanzeller, 2011)
A ilhota de São Pedro, no Bispo (FOTO: Wanzeller, 2011)
Orla do Bispo com o Trapiche da Vila ao fundo (FOTO: Wanzeller, 2011).
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