sexta-feira, 21 de janeiro de 2022

PRAIAS DA ILHA: PRAIA GRANDE

De frente para a baía do Marajó, na costa oeste da Ilha, a praia Grande localiza-se entre os barrancos da praia do Bispo e a prainha do Farol.

Foi uma praia bastante procurada no século passado, principalmente em sua segunda metade, pelos visitantes (denominados veranistas), que chegavam no navio da linha e, depois, a partir de 1976, com a inauguração da ponte, em ônibus de piquenique oriundos da periferia de Belém e de outras localidades. É aí que esses veranistas passaram a ser chamados de farofeiros. Não havia venda de comida na praia e todos precisavam trazer suas marmitas, onde não faltava a invariável farofa de ovo. Lembro que já fui farofeiro um dia, lá nos tempos de criança, quando eram comuns os piqueniques, nas afastadas e desertas praias da Ilha.












Foto de 1977: Blog Moskowilha

Nos citados anos, a praia era recoberta por uma extensa faixa de areia, que fazia a alegria dos banhistas e dos praticantes do beach soccer, nos domingos ensolarados. Sua orla era um verdejante barranco protegendo o terreno bem acima do nível do mar. As escadarias escavadas ao longo desse barranco facilitavam o acesso às fartas areias. Pouco a pouco, foram surgindo as barraquinhas de madeira construídas na praia, às proximidades do barranco. Sua finalidade era a venda de bebidas e comidas (destaque para o peixe de água doce); promovendo, assim, maior conforto à população.

Mais tarde, acredito que erroneamente, essas barraquinhas foram substituídas por construções de alvenaria sobre pilares de concreto com acesso direto à orla. Ora, a praia é o espaço do rio-mar determinado pela Natureza e isso ficou mais uma vez comprovado no final dos anos noventa e no início deste século, quando as águas de março e abril destruíram as barracas da praia Grande, levando, inclusive, toda a areia e deixando um tapete imenso de pequenas pedras. A praia estava acabada para os banhistas e seus momentos gloriosos de grandes diversões e alegria foram guardados no baú das recordações.

E por falar em diversão e alegria, não podemos esquecer do Bar São Sebastião de propriedade da Sr.ª Guiomar de Oliveira, um dos pontos mais frequentados na orla da praia Grande. Ali nasceu – e ainda não era bar – uma das festividades mais antigas da Ilha: a Festividade de São Sebastião da Praia Grande, devoção do final do século XVIII. Nas três últimas décadas do século passado, as tardes e noites dos domingos eram marcadas pelas festas dançantes ao som de aparelhagens, reunindo, no salão daquele famoso bar, veranistas e moradores da Ilha. Essas festas não existem mais. Entretanto, a tradição secular da Festa do Santo Padroeiro da Praia Grande continua bem viva, mantida tenazmente pelos descendentes da Dona Guiomar.


JANELAS DO TEMPO: SÃO SEBASTIÃO DA PRAIA GRANDE


Festividade de São Sebastião da Praia Grande, às proximidades da Vila do Mosqueiro, é, com certeza, uma das mais antigas da ilha. Essa tradicional festa promovida pela família Oliveira tem oficialmente cento e cinquenta e quatro anos, contados a partir de 27 de julho de 1856, data impressa no esplendor da imagem do Santo, trazida de Portugal por iniciativa do Sr. Domingos de Oliveira.

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São Sebastião (FOTO: Wanzeller 2011).

Sabe-se, entretanto, por informações colhidas há vinte e cinco anos atrás, em relatos da Srª Guiomar de Oliveira, que o início da festividade dataria de 1789 e que a imagem venerada era outra em tamanho menor, a qual foi doada à antiga capela da Irmandade de Nossa Senhora do Ó, depois que o Patriarca da família faleceu e um desentendimento no seio familiar acabou paralisando o evento por certo período.

Dos remotos tempos pouco ou quase nada se sabe; no entanto, a partir do Sr. Domingos de Oliveira, bisavô da atual promotora Srª Wanda de Oliveira, a festividade tornou-se tradicional, permanecendo através dos tempos por meio de manifestações populares de cunho religioso e profano, cujo ponto culminante acontece, invariavelmente, no dia 20 de janeiro, que é dedicado ao Santo no Calendário Litúrgico da Igreja Católica.

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FOTO: Wanzeller 2011.

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FOTO: Alice Lameira 2011.

É bom lembrar que, no dia 20 de janeiro do longínquo ano de 1836, as tropas do Governo Imperial tentaram, sem êxito, invadir a ilha, para combater os cabanos aqui sediados. Provavelmente, festejava-se o Santo nessa ocasião, porém a batalha se deu na Vila, em área limítrofe entre as praias do Areião e do Bispo, uma vez que, a partir desse ponto -- segundo relatos orais muito antigos -- falsos canhões feitos de troncos de miritizeiros pintados de preto protegiam, estrategicamente, os barrancos, que se estendem até a Praia Grande, engenhoso ardil usado pelos cabanos para manter as tropas legalistas afastadas.

Depois do Sr. Domingos, a festa de São Sebastião passou a ser comandada por seus filhos. Primeiro, o Sr. Ângelo de Oliveira e, posteriormente, Dona Eufrásia de Oliveira deram continuidade à tradição. Essa herança religiosa e cultural tão significativa para a ilha do Mosqueiro seria recebida mais tarde pela filha de Dona Eulália, a saudosa Dona Guiomar de Oliveira, cujo nome se tornou conhecidíssimo, tanto pela grandiosidade de suas festas quanto pelos atrativos que seu bar proporcionava aos frequentadores da Praia Grande, nos inesquecíveis veraneios dos anos 60 e 70.

Com a doença de Dona Guiomar (falecida em 1994), sua filha Wanda de Oliveira dos Anjos assumiu, em 1979, a Homenagem a São Sebastião e continua coordenando a festividade com muita fé e amor, conduzindo para o futuro essa devoção de seus antepassados.

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Dona Wanda de Oliveira (FOTO: Wanzeller 2011).

Atualmente, embora persista o Cortejo do Mastro conduzido por mulheres e o tradicional almoço da comunidade, a festa apresenta conotações mais religiosas, envolvendo devotos e promesseiros em uma série de novenas, missas e ladainhas, que são rezadas a partir do dia 10 de janeiro, além de romaria luminosa e procissão, nas quais é conduzida em andor a imagem do Santo.

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Cortejo do Mastro (FOTO: Alice lameira 2011).

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FOTO: Alice Lameira 2011.

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FOTO: Alice Lameira 2011.

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FOTO: Alice Lameira 2011.

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Novena de São Sebastião (FOTO: Alice Lameira).

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FOTO: Alice Lameira 2011

centenária imagem de São Sebastião, restaurada há pouco tempo por um especialista na Igreja de São Judas Tadeu, deverá, em breve, permanecer definitivamente em seu altar, para não ser mais exposta à ação prejudicial da umidade. Uma réplica deverá substituir a imagem original nas romarias e procissões do futuro, mantendo cada vez mais viva essa tradição do povo mosqueirense.

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Romaria Luminosa (FOTOS: Alice Lameira)

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