Autoria: Mosqueiro Vírgula
(PRAIA DO BISPO)... o nome tem que permanecer...
Essa história aconteceu há muitos e muitos anos atrás na Vila do Mosqueiro... Seu Antônio jurava de pés juntos e se benzia com a mão esquerda toda vez que contava o ‘causo’... Ele que trabalhou como guarda noturno, vigiando as casas, principalmente dos endinheirados que moravam na capital. Esses vigias não usavam armas de fogo, usavam apenas um cacete de madeira e um apito para fazer alarme e a comunicação com outros vigias.
Nessa época, já havia sido inaugurada a estação que distribuía energia elétrica para parte do vilarejo... Era um motor-- gerador de última geração importado, ‘Caterpillar’ de Ignitor Diesel... Havia uma caldeira onde colocavam pedaços de lenha (madeira) para elevação da Usina Termelétrica e equilíbrio da energia. Moradores da Vila que vivenciaram, comentam que a caldeira servia também para incinerar cachorros que eram pegos na rua pela famigerada carrocinha... A Usina era popularmente chamada de (Force-luz da companhia Cia Força e Luz) e funcionava na Rua 15 de Novembro, esquina com a Travessa Pratiquara no bairro da Vila. Neste local, havia uma chaminé que tinha aproximadamente 115 metros de altura e soltava fumaça no ambiente... Sabe-se também, que lá do alto da chaminé era possível ver a ilha de Outeiro nitidamente e a vista do pôr-do-sol mais lindo do mundo. Quando a usina foi desativada, demoliram a famosa chaminé. Infelizmente nessa demolição teve uma vitima fatal. Atualmente no endereço, “funciona” o prédio da Agência Distrital de Mosqueiro. Se o patrimônio houvesse sido conservado, hoje a CHAMINÉ poderia ser um símbolo histórico da nossa Mosqueiro e um atraente ponto turístico.
As luzes ficavam acesas até as 23 horas... Uma sirene soava melancólica. Era o momento de desligar os motores e Mosqueiro ficava no escuro. Contam os mais antigos que nessa escuridão era que as coisas estranhas aconteciam. Gente que virava porco, Matintaperera apitava, “O Assobiador” assobiava, almas penadas gritavam e transitavam livremente pelas ruas... Havia um lugar pior que tudo isso. Depois que as luzes se apagavam, ninguém se aventurava passar por lá... A CURVA DA “VILA FANECA”, que fica à Beira Mar no final da Praia do Bispo. Nesse lugar aparecia um ser misterioso e fazia qualquer marmanjo correr... Seu Antônio, homem ranzinza e metido a corajoso, era daqueles “cabras” que diziam não ter medo de nada; era igual ao São Tomé, “queria ver para crer”. Ele afirmava já ter dormido no cemitério várias vezes, assustado Matintaperera e posto Lobisomem para correr... De tanto ouvir falar nas assombrações que apareciam na “Vila Faneca” resolveu constatar o fato e trabalhar como guarda noturno. Certa noite, daquelas escuras como um “breu”, resolveu caminhar em direção à famosa curva assombrosa... Tudo aconteceu numa sexta-feira próximo à meia-noite. Era verão. Os pensamentos obsessivos de seu Antônio deixavam sua mente confusa, e meio resmungando, perguntava para si mesmo: “-- Será verdade o que falam dessas assombrações?” Como estava ali por perto, resolveu tirar a dúvida que tanto lhe perturbava. Somente algumas estrelas cintilavam no céu... No mar, as luzes de dois navios que estavam fundeados no rumo da “C’ROA de PEDRAS”... Olhou para trás e viu a luzinha verde do “Farol” que piscava à distância... Apesar de ser verão, a noite estava muito fria, devido à brisa que vinha do mar. As folhas secas rolavam no chão e faziam aquele som, como se alguém o estivesse seguindo. Com a maior naturalidade, seu Antônio caminhava em direção ao maior e último desafio sobrenatural de sua vida. Seu Antônio resolveu não levar o apito para não fazer barulho. E com toda calma, tirou o *¹“abade de onça” do bolso, o tabaco que trazia em uma latinha com um furinho amarrada por um pedaço de punho de rede que pendurava na cintura. Enrolou um *²“porronca” e acendeu... Quando ia pegar a lanterna que estava pendurada no outro lado da cintura, a lanterna caiu... Seu Antônio já estava em frente da ‘famosa vila’. De repente, à sua frente surgiu àquela criatura sombria e assombrosa com mais de dois metros de altura e possuía uma capa preta que cobria todo o vulto. Seu Antônio permaneceu adormecido, não podia mover-se. Faltou-lhe o ar e a voz. Seus cabelos arrepiados da cabeça à ponta dos pés, seus olhos embaraçados em pânico. Chegou a pensar que havia chegado a hora de partir para a “Cidade do Pé Junto”. Sua perna ficou trêmula... “-- O porronca?”, dizia ele: “-- Não sei até hoje, onde foi parar a purra”.
Agora eram somente eles dois... Ele e aquela criatura inanimada, no meio da escuridão. Aquele Dito-cujo ficou ali à sua frente inerte como que esperando uma reação do vigia que dizia ser corajoso; porém, o mesmo permaneceu calado e perplexo. Então, o ser estranho se manifestou com uma voz rouca e grave e disse: “-- Faça um serviço! Mine a notícia!”
O guarda noturno, neste momento, sentia-se o mais infeliz de todos os homens e totalmente arrependido do dia que veio à luz. Tentando se refazer do susto, abaixou-se, e apalpando, conseguiu pegar a lanterna e tentou focar o rosto da indivíduo. Nisso, pela roupa da criatura, percebeu que se tratava de um vigário sem cabeça. Seu Antônio, com a voz muito trêmula e abafada replicou: “-- Diz o que tu qué alma penada”. “-- Tava pa mi cagá nessa hora sô!”, comentava seu Antônio toda vez que relatava a história.
Nisso, a criatura anunciou com uma voz como se vindo das profundezas do inferno:
-- Quero que digas para todos, que esta Praia nunca mudará de nome e sempre será chamada de “PRAIA DO BISPO”. Caso tu não espalhes a notícia, morrerás em sete dias. Se tu fizeres tudo certo, plantarei na praia uma árvore que terá forma de *³SOLIDÉU para que saibam que o que falaste é verdade.
Nessa hora, sem explicação, um vento norte muito forte soprou e a figura do BISPO foi levada e desapareceu nas trevas. O vigia caiu no chão hipnotizado, retornando a si somente às seis horas da manhã... Pois o sol já vinha raiando. Dali para frente seu Antônio aprendeu a lição e nunca mais quis ficar de frente com o sobrenatural. Espalhou a notícia na Vila toda. A última vez que viram seu Antônio foi entrando no navio Presidente Vargas que fazia a viagem Mosqueiro-Belém (Belém-Mosqueiro). E ainda lá, ele falava sobre o “causo”...
A cem metros da curva da Vila Faneca fica o “Terreno dos Padres”. Até hoje, religiosos fazem encontros espirituais nesse terreno que fica localizado na Beira-Mar, atrás dos dois reservatórios elevados do sistema de abastecimento de água na Praia do Bispo. Foi lá que viveu um sacerdote misterioso, provavelmente da congregação dos maristas, que, apesar de falar pouco, gostava de dar ordens... Ninguém nunca descobriu o nome dele; atendia somente pelo título de Bispo... Este beato adorava passear todas as tardes pela orla da praia fazendo preces próximo às pedras “o REI e a RAINHA”; essas pedras ficam nas proximidades da curva entre a praia Grande e a Praia do Bispo. Existem comentários que este religioso viveu uma paixão platônica. Dizem que, quando ele morreu, seus companheiros atenderam um “pedido”: fizeram seu sepultamento ilegítimo na praia, provavelmente onde tem uma árvore em forma de boina muito bem podada pela natureza.
Se você visitar a praia do Bispo, é verdade! Realmente existe essa árvore em forma de um Solidéu que permanece no tempo e sustenta a narração...
Até hoje, quando falta energia, pessoas afirmam ver o “Capa Preta” e outras marmotas “por aquelas bandas”.
-- Eu é que não duvido!!!!!!!! Como já dizia o finado “Caboquinho”, “todas as cruzes!”
*************************************************************
*¹ Abade: Papel bem fino que serve para enrolar o tabaco migado e fazer o cigarro.
*² Porronca: (Regionalismo) cigarro feito de fumo na palha.
*³ Solidéu: Pequena boina usada pelos clérigos católicos e pelos judeus, significando o temor a Deus, que estaria acima de tudo.
FONTE: https://www.facebook.com/mosqueiro.virgula/posts/1423554747897916
Nenhum comentário:
Postar um comentário