sexta-feira, 24 de junho de 2011

EVENTO CULTURAL: AS RAÍZES PROFANAS DE SÃO JOÃO

Autor: Marcelo Affini

“A fogueira de São João nasceu antes de São João. Quando o Vaticano instituiu, no século VI, o dia 24 de junho para a comemoração do nascimento daquele que batizou Cristo, os povos europeus já celebravam com grandes fogueiras, a chegada do sol e do calor. Em 58 a.C., quando o imperador romano César conquistou a Gália (França), os bárbaros já comemoravam o solstício do verão, no dia 22 ou 23 de junho – o momento em que o Sol pára de afastar-se (solstício vem do latim e significa “sol estático”) e volta a incidir em cheio sobre o hemisfério norte. “Os cultos pagãos eram rituais de abundância e fertilidade”, diz a professora Maria Lúcia Montes, antropóloga da Universidade de São Paulo. “Havia sacrifícios de animais e oferendas de cereais para afastar os demônios da esterilidade, das pestes agrícolas e da estiagem”. O cristianismo, na verdade, apenas “converteu” uma tradição pagã em festa católica.

Até hoje, as tradições pagãs e cristãs convivem. A seita Uika, inspirada nos antigos celtas (povo que dominou o oeste da Europa no primeiro milênio antes de Cristo) acende grandes fogueiras ao redor do mundo, no solstício do verão europeu. No Brasil, a Uika promove comemorações místicas, com mais de 500 pessoas, no dia de São João, em São Tomé das Letras (MG) e Mauá (RJ). Na Espanha, as Hogueras de San Ruan são uma das tradições mais cultivadas, especialmente na Catalunha.

Em Portugal, as comemorações foram ampliadas no século XIII, incluindo o dia de Santo Antônio de Pádua (que nasceu em Portugal, mas morreu na Itália, no dia 13 de junho) e o da morte de São Pedro, em 29 de junho. Transportadas para o Brasil colonial, as festas “pegaram” entre índios e escravos. Descrevendo as celebrações católicas “assimiladas” pelos indígenas, o jesuíta Fernão Cardim escreveu em 1583, em seu Tratado da Terra e da Gente do Brasil: “A mais alegre é a das fogueiras de São João, porque suas aldeias ardem em fogo e, para saltarem as fogueiras, não os estorva a roupa, ainda que algumas vezes chamusquem o couro”.

Com a chegada da família real portuguesa, que se transferiu para o Brasil, fugindo de Napoleão, na Europa, as festas juninas tomaram novo rumo. Junto com os 15.000 aristocratas que desembarcaram no Rio, em 1808, veio a contradança (originada nos country-dances, bailes camponeses da Normandia e da Inglaterra) que animava as festas da realeza. Era uma dança de casais que trocavam de pares. Não demorou muito, as contradanças saíram dos salões nobres para as festas populares. Casamentos, batizados, festas juninas, festas de padroeira e muitas outras passaram a ser comemoradas com a dança francesa.

No final do século XIX, surgiram formas mais modernas e urbanas de dançar, como a polca, o maxixe e o lundu, e as quadrilhas foram desbancadas. Entretanto, permaneceram na zona rural, onde a população é mais conservadora. A partir de 1930, quando o nacionalismo de Vargas estimulou a busca de uma identidade cultural brasileira, a vida rural foi revalorizada. Segundo o antropólogo Renato da Silva Queiroz, da USP, “junto com a temática do homem do campo surgiu a dança caipira que nada mais é do que a quadrilha de origem aristocrática com adaptações”.

Hoje, a evolução segue a direção do espetáculo. Segundo o antropólogo Ricardo Lima, da Funarte (Fundação Nacional da Arte), no Rio de Janeiro, há mais de 700 “quadrilhas monumentais” no estado. “São grupos de encenação que vestem roupas caríssimas, imitam os trajes das contradanças francesas do século XVIII e aproveitam as quadras de escolas de samba para ensaios”, conta Lima. As novas quadrilhas usam, cada vez mais, temas como enredos de carnaval, adotam alegorias e dançam ao som de música sertaneja e música funk Dentro em pouco, teremos a tecno-quadrilha.

São João Batista

“Nasceu em 24 de junho, primo de Cristo e precursor do Messias. O catolicismo associou sua tradição à festa pagã da fogueira. Assim, segundo a lenda, Isabel, a mãe de São João, teria anunciado o nascimento do filho à irmã, Maria, mãe de Jesus, acendendo uma fogueira em cima de um morro. A fogueira virou bom presságio. São João foi degolado por ter denunciado o adultério de Herodes com a cunhada Salomé.”

FONTE: Revista SUPER INTERESSANTE. ANO 9. Nº 6 – JUNHO 1995. pp. 26 e 27.

MOSQUEIRANDO: Com a chegada dos projetos de urbanização na ilha do Mosqueiro e o conseqüente asfaltamento de suas ruas, a tradicional fogueira de São João vai desaparecendo, assim como ocorre com os terreiros juninos. No entanto, o espírito festivo da época continua bem vivo nos grupos folclóricos da ilha (quadrilhas, bois-bumbás e pássaros), no FORROILHA, festival junino promovido pela AGRUFEM (Associação dos Grupos de Folclore do Mosqueiro) e ONG VIVA MOSQUEIRO e nas Festividades de Santo Antônio, São João e São Pedro. Se a fogueira vai-se extinguindo, São João continua sendo comemorado entusiasticamente, nas festividades promovidas pelo CHIBIRICA e pela ESTAÇÃO PRIMEIRA DE MARACAJÁ, com direito a MASTRO e animadas festas dançantes.

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