sábado, 31 de dezembro de 2011

CANTANDO A ILHA: MOSQUEIRO E COPACABANA

Autor: Cândido Marinho da Rocha

Todos os dias no Mosqueiro são feriados. Vive-se num eterno domingo. Quem assim decidiu foi o próprio Anacibe, o moço das infelicidades buriladas. Há um estado permanente de êxtase naquela gente. Acredita-se, agora, tantos anos depois dos acontecimentos aqui expostos, que só em Copacabana são encontradas pessoas tão desocupadas e tão felizes. Aquele ir e vir carioca, aquelas piadas, aqueles olhares sorridentes, que só não são encontrados nos motoristas de ônibus, tudo existia na Ilha paraense. A mesma predileção para a conversa fútil, confiada e humorística; a mesma facilidade com que se encontram e se comunicam homens e mulheres; o mesmo sentido de superior indiferença pelo Futuro; a mesma despreocupação; a mesma galanteria – tudo foi copiado por Copacabana daquela bela Ilha chamada Mosqueiro.

Veja-se que estamos em 1933 e ainda hoje, quarenta anos depois, Mosqueiro e Copacabana se assemelham em relações humanas de toda a espécie. Além disso, no Mosqueiro existem praias que são belas enseadas, tal como Botafogo, Flamengo, Copacabana, pois assim são Farol, Morubira, Ariramba e São Francisco.

A Ilha é cercada de amor por todos os lados. Copacabana por todos os lados é amor. A Ilha acolhe e reverdece as mulheres. Copacabana é a princesinha que a todos reanima. Na Ilha, mulheres belas se despem desinibidas. Em Copacabana, elas descem despidas de inibições. As noites de Copacabana são luminosas e protetoras. As do Mosqueiro são acolhedoras e discretas. As manhãs, lá e cá, são uivos de animais no cio. As tardes, lá e cá, amparam projetos de novos programas.

Aceita-se a palavra de Anacibe. Mosqueiro é um eterno domingo.

Domingo festivo, colorido, ventilado, saudável, afrodisíaco.

Quem fala em morrer em Copacabana? Quem vai ao Mosqueiro para morrer? Morte é palavra morta entre mosqueirenses e copacabanenses. Uma tem água fria nas praias, outra tem água morna. Ambas, sugestões acariciantes ao pecado. Portanto, sugestivas e pecadoras são ambas, com suas antenas a captarem olhares lúbricos, gestos eróticos, palavras embriagadoras. Ambas enfeitam-se com os reinos animal, mineral e vegetal. Com o panorama combinado de mulheres, do mar e das flores. Ambas protegem, escondem, aconselham sonhos de felicidade. Ambas são deixadas por Deus para uso de um povo despreocupado, que não se contenta mais com a admiração que lhe provoca a minissaia. Ambas as praias que querem mais, muito mais, se Deus quiser.”

(FONTE: MARINHO ROCHA, Cândido. “Ilha Capital Vila”- GRÁFICA FALANGOLA EDITORA. Belém-Pa, 1973- pp. 129 e 130)

MOSQUEIRANDO: Eis que mais um ano se vai! As tristezas, os problemas que a custo resolvemos, os projetos não concluídos vão que vão ficando no passado. Só restarão a saudade dos momentos felizes que vivemos intensamente e a certeza alegre de um novo recomeço. Sim, se Deus quiser, nós continuaremos a fazer a História! Queremos agradecer a vocês, internautas da cultura, a visita frequente a este blog e desejar a todos um FELIZ 2012!

sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

JANELAS DO TEMPO: UM NATAL EM MOSQUEIRO

Autor: Gabriel Pereira

“Quando o assunto é travessura, não dá para esquecer de dois irmãos: os gêmeos Alexandre e Joseph Farah. Filhos de Raymundo e Maria de Lourdes, os Farahzinhos, como eram conhecidos por todos que frequentavam a ilha nos anos 50 e 60, eram dois que pareciam um, mas valiam por dez, segundo Leonam Cruz, amigo da família.

A história aconteceu na véspera de Natal, no bairro do Farol. Naquela época, era comum algumas famílias abastadas de Belém, proprietárias de belas residências, passarem as férias escolares de fim de ano em Mosqueiro. Isso incluía o Natal.

As festas natalinas promovidas por essas famílias eram tão animadas, que se transformavam em atrações na Ilha. Depois dos festejos, as crianças se recolhiam em seus quartos. Elas ficavam ansiosas pela chegada do Papai Noel, que traria os presentes delas. Entre as crianças estavam os irmãos Farah. Fingindo que iam dormir sossegados, ficavam à espreita observando, por entre as frestas da porta, a chegada do bom velhinho. O que não demorava para acontecer.

Certo dia, Yêda, irmã dos Farahzinhos, os procurou para fazer uma confissão: “Eu descobri que aquela história de Papai Noel é uma fraude, uma grande mentira. E eu tenho como provar”. Depois do desabafo, ela levou os dois à casa do caseiro Manoel Cearense, onde encontraram as roupas de Papai Noel e três sacos de cetim vermelho, com os nomes das famílias de Raymundo Farah, Pedro de Castro Álvares e Marcos Athias.

Embora entristecidos com a descoberta, não perderiam a viagem. Foi então que resolveram aprontar uma... Eles trocaram as etiquetas com os nomes dos destinatários.

O que, no primeiro momento, foi uma decepção, logo se transformou em uma grande diversão para os gêmeos travessos. A exemplo de anos anteriores, foram se recolher cedo para esperar o desenrolar dos fatos. Por meio das frestas das portas e janelas, os Farahzinhos puderam, em meio a gargalhadas, observar três “Papais Noéis” atrapalhados. Eles corriam de uma casa para a outra, com os sacos nas costas tentando desfazer o engano. Eles nem imaginavam como aquilo tinha acontecido, afinal haviam conferido tudo com antecedência.”

FONTE: Pereira, Gabriel - “Um Natal em Mosqueiro"\in __ Revista Ilhas Amazônicas: o arquipélago de Mosqueiro – parte 1, Ed. 01, JAN 2006. P. 40.

MOSQUEIRANDO: A figura simpática e bondosa do PAPAI NOEL sempre existirá de verdade no coração daqueles que conseguem SENTIR e VIVER o verdadeiro ESPÍRITO NATALINO. Fazer a alegria de uma criança, cujo mundo é sempre repleto de projetos fantasiosos e de esperanças, é perpetuar a figura do BOM VELHINHO. Comemorar o NATAL do MENINO JESUS, levando ao próximo o AMOR, o PERDÃO, a SOLIDARIEDADE e um ABRAÇO FRATERNO é ter consciência de que se vive o momento de RENASCER PARA UMA NOVA VIDA. FELIZ NATAL!

quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

A ARTE NA ILHA: ARTES PLÁSTICAS NA BAÍA DO SOL

 

Dentre inúmeros artistas e artesãos do Mosqueiro, três nomes sobressaem nas artes plásticas cultivadas na Baía do Sol.

No início da década de 70, ali, na região leste da Ilha, despontava a figura simpática do escultor Raimundo Neves Monteiro, cuja principal obra O BICHO DE SETE CABEÇAS, peça artisticamente talhada em uma raiz de bacurizeiro, por longo tempo, enfeitou a pracinha da praia do Bacuri, lembrança perdida nas sendas do passado. O talentoso artista, que era funcionário da Escola Lauro Chaves, também fazia esculturas em cimento.

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Raimundo Neves Monteiro e seu dragão (FONTE: A. MEIRA FILHO, 1978)

Na pintura, ressaltamos o nome do artista Lilás Valente, cuja obra intitulada A LOBA VAI TER FILHO foi contemplada com o “Prêmio Aquisição”, no Concurso Arte Pará 1991.

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A loba vai ter filho” – 1991 – Técnica mista – dim. 46 x 58

Outro pintor mosqueirense tem produzido belíssimas telas. Falamos do artista Hernandes Havishe, também natural da Baía do Sol, cujas obras vêm merecendo comentários elogiosos. Eis algumas:

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FONTES:

http://www.baiadosolsempre.blogspot.com/search/label/BICHO%20DE%20SETE%20CABE%C3%87AS

http://www.baiadosolsempre.blogspot.com/search/label/a%20loba%20vai%20ter%20filho

http://www.baiadosolsempre.blogspot.com/search/label/Hernandes%20Havishe

terça-feira, 20 de dezembro de 2011

JANELAS DO TEMPO: O CANHÃO DO CHAPÉU VIRADO

 

Sabe-se que, lá pelos idos de 1943, quando estava em curso a Segunda Guerra Mundial, uma tropa de infantaria ficou aquartelada na conhecida Rua da Bateria. O antigo prédio do Colégio Nossa Senhora do Ó funcionava como quartel-general, enquanto os prédios da Escola Municipal Donatila Santana Lopes e da FUNPAPA serviam de alojamentos para os soldados.

Na praia do Chapéu Virado, que, no século anterior, fora palco da sangrenta batalha da Cabanagem, instalou-se um canhão, uma espécie de avançado defensor da Capital, pronto a enfrentar embarcações inimigas que adentrassem a baía.

Essa peça de artilharia, a princípio, despertara estranheza e temor na população simples da ilha. Depois, certa indiferença, acabando por servir de motivo a situações jocosas, bem ao gosto do autêntico mosqueirense.

Para conhecer melhor os detalhes dessa história, vamos recorrer ao grande escritor da literatura paraense Cândido Marinho da Rocha:

“Certo dia, um capitão de artilharia e um tenente de infantaria dirigiam o desembarque de uma peça de artilharia na praia do Chapéu Virado. Os brasileirinhos tímidos daquelas orlas espantaram-se com a novidade. Perguntavam-se:

-- Mas então que é isso já?

-- A guerra é nossa também?

-- A guerra não é do povo de lá de lá?

-- Como então eles vão poder atacar a gente?

-- Já viram que coisa pesada e triste como esse um aí?

-- E agora, se eles vierem?

Respostas esquivas, miúdas, assim:

-- Melhor prevenir que remediar.

-- Que sabemos nós de guerra?

-- Esse um tenente Carlindo não fala pra gente?

-- Só porque está fardado, não é? Esqueceu da gente? Das festas da Babá e das serenatas com o finado Estrela? Axi...

-- Ele até que faz que ri por cima do galão, mas falar mesmo, necas.

-- Deve ser respeito a ess’ outrão capitão “disque” Luiz Felipe.

-- Deve ser, deve ser – cantavam os brasileirinhos.

A peça, ali, pescoço estirado, com a venta na direção da baía, muito vigilante, soldadinhos elegantes ao lado, em faceirices, difíceis.

Moreninhas brasileirinhas encabuladinhas chegando, de tardinha, mansinhas, apalpandozinhas o bichão, em tremuras delicadas. Risos delas. Sisudez dos soldados, defensores do litoral brasileiro.

Até que o canhão era bonito, mas não dava tiros. Era aquilo ali parado como jacaré dorminhoco, jaburu pensativo, coruja rasga-mortalha, gavião do dia, espiando longe. Alguns meses depois da instalação, vencidos os primeiros temores, provado que a peça era mesmo mansa, parecença de maracajá com pinta de onça, como onça mas sem onça ser, os brasileirinhos das beiradas já se divertiam com a imobilidade do bicho.

-- Tu já viste como ele nem pisca?

-- Tu já viste como se parece com ponte de buriti em cama de lama?

-- Nem vento nem tempo faz ele bulir.

-- Nem sobe nem desce, nem vai nem vem.

Eram assim, ingênuos, brincalhões, humoristas, ausentes dos fatos das longas profundas verdades das guerras. Às vezes, quando o sol parecia muito vermelho, muito grande, ao descer do outro lado e mergulhar como que na baía, os brasileirinhos comentavam:

-- Chiiii, cunhado, hoje a guerra foi feia. Vê como o sol está melado de sangue. Aquilo é sinal de matança por lotes.

Mas, já na seguinte úmida madrugada, na rede pobre, longe iam dos brasileirinhos os tristes pensamentos da guerra.”

“Não se sabe como foi que começou a brincadeira. Quando os chocalhantes ônibus passavam em frente ao canhão, gritavam todos:

-- Olha o bicho!

Como que a comando, a turma se curvava nos assentos para que, diziam, não fossem atingidos por disparos.

Acabou incorporado à paisagem. Crianças brincavam perto, sem medo algum. Reuniam-se mocinhas à noite ali sob a proteção da arma amiga, e cantavam, namoravam e eram felizes.

Paradoxalmente, foi um dia de tristeza quando chegaram barcaças à praia para conduzir a Belém aquele pedaço da História da Humanidade. Retirava-se decentemente da mais pacata e amorosa ilha do mundo, sem um tiro sequer.

Os oficiais diretores da operação, obsequiados pelos moradores, não eram mais considerados invasores, haviam cumprido com o dever para com a ilha, que parecia sorrir, contente. Todos queriam ajudar a empurrar a peça, todos queriam falar a Carlindo, velho amigo, e com orgulho, viam-no assim, porque fora habitual freqüentador de festas e serenatas e praias. Bem bonito, farda verde-oliva, perneiras, talabarte, duas estrelas azuis em cada ombro, quepe aprumado, postura correta, a colaborar, na qualidade de Encarregado dos Serviços de Embarque da Região.”

(FONTE: MARINHO ROCHA, Cândido. “Ilha Capital Vila”- GRÁFICA FALANGOLA EDITORA. Belém-Pa, 1973- pp. 178, 179 e 180)

segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

A IMAGEM E O TEMPO: A CAPELA DE SANTA CATARINA DE SENA

 

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No dia 19 de agosto de 1963, foi lançada a pedra fundamental da Capela Santa Catarina, no Colégio Nossa Senhora do Ó, Chapéu Virado (antiga Estrada da Bateria), segundo Pergaminho existente no Arquivo do Arcebispado, no qual consta a Ata da Bênção, cuja cópia autêntica, cedida ao historiador Augusto Meira Filho pelo então Arcebispo Metropolitano D. Alberto Gaudêncio Ramos, tem o seguinte teor:

“Aos 19 dias do mês de Agosto de 1963, perante o Exmº. Sr. Arcebispo D. Alberto Gaudêncio Ramos, o Revmº. Vigário, Padre Nazareno Menezes Moreira, o Exmº. Sr. Aguinaldo Santos, Sub-Prefeito Municipal, Sr. Delegado de Polícia, Marcolino Aguiar, Dr. Lameira, Monsr. José Maria do Lago, Irmã Maria Josefina Stortini, D. Joana Gaspar (digo) Grassar, Diretora do Grupo Escolar “Inglês de Souza”,, Profas. E demais autoridades presentes ou representadas, pessoas gradas da cidade e Vila. Benzeu com as orações litúrgicas a 1ª. pedra (urna canônica), depositando dentro desta a Ata, os jornais do dia, algumas moedas correntes do país, tendo assinado ante as pessoas acima mencionadas e demais fiéis presentes. Nada mais havendo a tratar, encerra-se esta com as formalidades do costume.

(as) + Alberto Ramos, Arcebispo; Pe. Nazareno Menezes Moreira, Vigário; Monsr. José Maria do Lago; Aguinaldo Santos; Luiz Lima Bentes; Irmã Ma. Josefina Stortini; Irmã Rosa Miranda; Irmã Clarisse Gomes da Costa; Irmã Maria Petronila Arcene; Irmã Aurea de Oliveira Lima”.

FONTE: (Meira Filho, Augusto – “Mosqueiro Ilhas e Vilas”, Grafisa Ed., 1978, pp. 97 e 98).

MOSQUEIRANDO: Passados quarenta e oito anos, vamos desfazer um pequeno equívoco ocorrido no citado documento histórico: o nome registrado como D. Joana Gaspar e, de imediato, corrigido pelo escriba para Grassar não corresponde ao verdadeiro nome da antiga Diretora do Grupo Escolar “Inglês de Souza”: Joana Lisboa Agrassar.

quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

NA ROTA DA HISTÓRIA: OS PASSOS DA DEVOÇÃO À SENHORA DO Ó



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   N. Srª do Ó- Catedral de Évora, Portugal.              Imagem antiga na ilha do Mosqueiro.

01. Ano 656 d. C. (Toledo, Espanha): A festa da Anunciação, transferida para o dia 18 de dezembro, celebra Nossa Senhora da Expectação.
02. Ano 1148 (Torres Novas, Portugal): Devoção a Nossa Senhora de Almonda.
03. Ano 1187 (Portugal): Devoção a Nossa Senhora de Alcáçova.
04. Ano 1212 (Portugal): A imagem passa a ser chamada de Nossa Senhora do Ó.
05. Ano 1545 (ilha do Mosqueiro, Pará): Francisco de Orellana chega à Baía do Sol, em 18 de dezembro, dia consagrado à Santa.
06. Ano 1653: Os jesuítas instalam a Missão Myribira na ilha do Mosqueiro e trazem a devoção à Nossa Senhora do Ó.
07. Ano 1709 (Olinda, Brasil): Tem início o culto na Capitania de Pernambuco, com o donatário Duarte Coelho.
08. Ano 1719 (Olinda, Brasil): Em 28 de julho, os olhos da imagem vertem lágrimas.
09. Ano 1795: Cópias da imagem são levadas para a ilha de Itamaracá e São Paulo.
10. Século XVIII (Sabará, Minas Gerais): Os bandeirantes introduzem a devoção à Santa e é construída, em estilo indo-europeu, a Capela de Nossa Senhora do Ó.
11. Século XIX: A Irmandade de Nossa Senhora do Ó inicia o culto na ilha do Mosqueiro, venerando a Santa em pequena capela, na praça do povoado.
10. Ano 1868 (ilha do Mosqueiro, Pará): Em 10 de outubro, o Cônego Manuel José de Siqueira Mendes cria a Freguesia do Mosqueiro, sob a égide de Nossa Senhora do Ó, desapropriando a capela da Irmandade para transformá-la em Igreja Matriz.
11. Ano 1869: Em 02 de abril, o Bispo da Província do Grão-Pará Dom Macedo Costa designa como primeiro pároco da Freguesia do Mosqueiro o Padre Manuel Antônio Raiol
12. Ano 1869: O Padre Manuel Raiol assume a nova paróquia e transfere o cemitério que existia na praça, área contígua à capela, para o local onde se encontra atualmente, na Travessa Pratiquara.
13. Ano 1914: É inaugurada a Igreja Matriz da ilha do Mosqueiro.
14. Década de 1920: Tem início a Procissão do Círio na ilha, com a imagem de Nossa Senhora de Nazaré saindo da Casa-sítio dos Irmãos Maristas, na antiga estrada da Praia Grande.
15. Ano 1929: O Círio passa a ocorrer no 2º domingo de novembro, por determinação de D. João Irineu Joffily.
16. Década de 1950: A imagem de Nossa Senhora do Ó substitui a de Nossa Senhora de Nazaré e o Círio é realizado no 2º domingo de dezembro, com seu trajeto ampliado para a Capela do Sagrado Coração de Jesus, no Chapéu Virado.
17. Ano 1965: Em 12 de dezembro, dia do Círio do Mosqueiro, chega à ilha, pela primeira vez, a Imagem Peregrina de Nossa Senhora de Nazaré e participa da Procissão.
18. Ano 2008: Em 05 de outubro, em comemoração aos 140 anos da Paróquia, foi apresentada pelo pároco Pe. José Maria da Silva Ribeiro e abençoada pelo Arcebispo Metropolitano de Belém, Dom Orani João Tempesta, a nova imagem de Nossa Senhora do Ó, criada exclusivamente para a Ilha
19. Ano 2011: No dia 11 de dezembro, próximo domingo, realizar-se-á o Círio de Nossa Senhora do Ó, a maior festa da cristandade mosqueirense.
PARTICIPE DO CÍRIO DE NOSSA SENHORA DO Ó, NO PRÓXIMO DOMINGO, NO MESMO DIA EM QUE OS PARAENSES DE NASCIMENTO E DE CORAÇÃO, VOTANDO EM UM PLEBISCITO HISTÓRICO, DECIDIRÃO O FUTURO DO NOSSO ESTADO: DIVIDIR OU NÃO? EIS A QUESTÃO! QUE A SENHORA DO Ó ILUMINE A TODOS! FELIZ CÍRIO!

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APRENDIZES NO MARAVILHOSO CAMINHO DA MÚSICA HOMENAGEIAM A SENHORA DO Ó COM O HINO À PADROEIRA:


sábado, 3 de dezembro de 2011

JANELAS DO TEMPO: UMA VOZ QUE VEM DO PASSADO

Autor: Augusto Meira Filho

A rodovia sonhada e desejada por tantos e por tão poucos acreditada surgia da floresta como um milagre. Milagre vintenário, é certo, mas que se efetivaria mesmo a contragosto de muita reza cantada e torcida nas madrugadas, para que ela jamais tivesse o fim que teve. A santa padroeira, ao colo igualmente puro de um sacerdote modelo, marcaria, em sua passagem, abençoando a nova rodovia, a fixação de uma obra que se formou de ideal, de tenacidade, de permanente atenção, de acendrado amor e, principalmente, de espírito público, únicos tentáculos que a alimentaram em vinte anos de trabalhos constantes e de incentivos a quantos tiveram a feliz chance de tributar-lhe um pouco de seu prestígio e autoridade. A sua realidade objetiva foi somente desse processo histórico, desse modus faciendi, desse élan em que se formam os grandes espíritos, aqueles que são capazes de construir sem a obstinação do lucro fácil, de erguer alguma coisa sem a morbidez da vaidade, de semear para que os pássaros colham o alimento necessário aos filhos.

Foram essas as sementes daquele sonho que não pousou na mentalidade estéril de descrentes e nem na inteligência dos que pecam em pensamentos e obras. Frutificou tanto que agora a árvore do bem e da virtude necessita de escadarias de ouro para alcançar suas copas, suas flores e seus frutos. E nem todas as mãos poderão ali pousar, sem que os rebentos da sementeira murchem dolorosamente, como os da lenda antiga que transformava em pedras os pomos tocados pela maldade dos homens maus e impiedosos.

O que ocorre com a rodovia, permitindo acesso fácil entre Belém e o Mosqueiro, é a constatação do bem público efetivado, da obra que presta serviço comunitário, do empreendimento que se justifica por si mesmo, aquele que muitos trogloditas de ontem julgavam inoportuno, inexeqüível, absurdo, antieconômico, loucura inútil e, agora, são eles os primeiros a usufruir suas vantagens, seus benefícios, seus interesses inconfessáveis. Para os que amam aquela ilha, para os que sempre acreditaram na obra rodoviária, para os que colaboraram de uma forma ou de outra, ela foi e é, apenas, o que todos desejavam: a solução técnica para a penetração no balneário, sem os atropelos, os desgastes, as canseiras, as despesas, os infortúnios e dispêndios antes pelo barco do Snapp sucessor da velha “Port of Pará” que introduzira a navegação a vapor de Belém até o Mosqueiro.”

“Pela sua natureza típica, a ilha balneária do Mosqueiro possui todas as características para se tornar um grande centro subsidiário da capital. Não só sob esse aspecto de centro turístico por excelência, mas, também, pela amplitude de suas terras, pela riqueza de suas florestas, pelo seu solo ubérrimo, pela sua extensão territorial, pelo seu clima ameno, pela sua proximidade a Belém, pela sua integração à área metropolitana preconizada pelos mestres da economia regional.

O aproveitamento dessas qualidades, aliado à questão turística e às suas condições privilegiadas para funcionar como centro de abastecimento da capital, centro agropecuário e de indústria da pesca, além de permitir instalações modelos para o desenvolvimento da agricultura e do interesse pela criação, a região do Mosqueiro, parte integrante e de importância na expansão da cidade, como elemento vivo da área metropolitana, poderá ser transformado em uma espécie de módulo experimental no seu sentido econômico, implantando-se, em fases distintas e em terrenos próprios, as fontes de produção e abastecimento da capital paraense, nos moldes utilizados aos cinturões verdes, nos limites perimetrais do centro urbano.

Belém cresce no rumo leste, entre as duas bacias predominantes do Guajará e do Guamá. Estende-se a cidade nesse promontório, nessa península extensa que tem início em Ourém pela costa guamaense e na Tijoca, na orla guajarina. O eixo de expansão se centraliza, desde sua saída em São Braz (centro suburbano), alcançando o centro rodoviário (Entroncamento) e dirigindo-se no curso da velha estrada do Maranhão dos tempos primitivos em direção de Ananindeua, Santa Izabel, Castanhal, etc.

Necessariamente, o eixo de crescimento vai ter suas fronteiras tangenciais, na altura de Ananindeua ou Benevides, fixando a metrópole e determinando sua faixa de expansão urbana, suburbana, periférica com seus atuais arrabaldes. Contrastando com o começo do século (XX), sente-se que o fraturamento do antigo município de Belém, o ainda existente à época progressiva dos governos Montenegro-Lemos, com a delimitação de novas áreas, em nada contribuiu para prosperidade dessas novas áreas municipais; há um regresso e a expansão de Belém, como há muito defendemos, vai receber de volta suas terras antigas, incluindo-se, então, estes dois últimos municípios, para a fixação de uma terceira légua, indispensável à evolução da cidade no rumo oriental de seu crescimento.

Todas essas razões vinculadas ao problema do Mosqueiro se unificam em um só todo, como que a exigir, nessa forma evolutiva, a incorporação de regiões que hoje dependem diretamente da grandeza da capital paraense e sem a qual estariam condenadas a um futuro incerto. E a construção da ponte, objeto desses estudos, sem dúvida, é fator que se impõe, tal como a abertura da rodovia Montenegro para Icoaraci, a Avenida Cabral para o Cais, a do Coqueiro para o contorno geográfico dos seus limites, a perimetral no Guamá ao lado da Universidade e a penetração já projetada para as terras do “Aurá”. Observa-se, à primeira vista, a necessidade de se compor um plano diretor dessa área metropolitana, incluindo-se legislação específica que defina a utilização das terras, os planejamentos horizontais das zonas de expansão e as delimitações das diversas características de que Belém necessita, em função de seu passado grandioso, para garantir o futuro que se aproxima vertiginosamente e carece, do poder público, atenção cuidadosa e especial, para evitar-se, em tempo, os dissabores decorrentes do crescimento desordenado, criando a indisciplina urbana e tornando impraticáveis as soluções dos problemas infraestruturais.

Senhores:

Acreditamos, sem sofismas e confiantes, no crescimento desta cidade em termos amazônicos, isto é, de grandiosidade e de opulência. Não poderíamos excluir dessa nova ordem o que está autêntico neste fim de século, a incorporação à cidade propriamente dita dessas áreas circunvizinhas e que, de uma forma ou de outra, serão atraídas pelo natural desenvolvimento da urbe belemense.

Passou a época em que as vilas do Pinheiro (hoje Icoaraci), a de Ananindeua, a de Benevides e a do Mosqueiro, e esta, principalmente, pareciam distantes do centro urbano. Isso ocorria aí pelos idos do século passado (XIX), quando o governo edificava a cidade para o futuro, erguendo obras duradouras, majestosas e definitivas, como o Teatro da Paz, a Prefeitura Municipal, a ampliação dos bairros na Campina, os primeiros passos para a solução dos problemas de abastecimento d’água, a pavimentação das ruas principais, a instalação da ferrovia bragantina, a delimitação de novas artérias, a abertura dos bairros do Umarizal, do Marco e do Souza. Logo após viria a bélle-époque do fastígio da borracha e o ciclo gigantesco das obras monumentais do Governador Augusto Montenegro e do Intendente Antônio Lemos. Isso daria à capital do Estado prestígio único na comunhão brasileira. Daí partiram novas aventuras nesse processo expansionista da cidade em direção ao sertão, no eixo predominante da primitiva estrada do Maranhão, depois Tito Franco, hoje Almirante Barroso. Dessa maneira, o alargamento urbano, a conquista dos arredores, a aproximação dos vilarejos periféricos à cidade se comportariam, é lógico, como centros de atração para que a velha instalação de Castelo Branco se tornasse iminentemente continental, fugindo às influências dos rios, das orlas marítimas ou fluviais.

Dessas conclusões, é certo o caminhar da evolução urbana de Belém no sentido de sua continentalização, a mesma amplamente defendida pelo professor Eidorfe Moreira em belo trabalho sobre a nossa cidade. Quanto mais ela penetra, diríamos, mais caminha em seu próprio encontro, pois é de leste que virá a sua prosperidade econômica, social, política, geográfica e turística, para não permanecer apenas como qualquer outra cidade brasileira litorânea, mas eixo de comando, pórtico real e indiscutível dessa Região Amazônica imensamente rica, permanente boca-do-sertão desse continente planiciário que, desde seus primeiros dias, dirige, orienta e pensa através de sua gente e da inteligência de seus filhos.

E nesse complexo de sua formação, Belém traz, dentro de si mesma, aquele determinismo histórico estereotipado em seus três séculos e meio de progresso, onde, certamente, a Ilha do Mosqueiro tem papel preponderante e decisivo para a saúde e a felicidade de sua população, que vive, trabalha, luta e sonha por dias melhores, sob o sol inclemente do equinócio e a dureza natural de um clima forte e imutável da Região Amazônica, da qual ela é propulsora dando a vida de sua vida à mais bela cidade plantada pela mão do homem na linha Equatorial.”

(Meira Filho, Augusto – “Mosqueiro Ilhas e Vilas”, Grafisa Ed., 1978, pp. 500, 501, 506, 507 e 508).

O autor:

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AUGUSTO EBREMAR DE BASTOS MEIRA, filho de José Augusto Meira Dantas e de Anézia de Bastos Meira, nasceu em Belém do Pará, no dia 5 de agosto de 1915. Cursou o Primário no Colégio Nossa Senhora de Nazareth, o Secundário no Ginásio Paes de Carvalho e o Superior na Escola de Engenharia do Pará. Foi escriturário na antiga Câmara dos Deputados, desenhista e auxiliar de engenheiro e, como engenheiro civil, ocupou vários cargos no Serviço Público do Estado do Pará, sendo agraciado com diversos diplomas e medalhas de Honra ao Mérito. Como parlamentar, foi Vereador, líder da ARENA, de 1971 a 1973, trajetória cuja importância se acha traduzida no fato de o prédio que abriga a Câmara ter recebido o seu nome: Palácio Augusto Meira Filho. Destacou-se também como jornalista em “A Província do Pará”, historiador e escritor. Além de artigos e conferências publicados em sua maioria na Revista de Cultura do Pará e de diversos discursos e notas de viagem, produziu obras fundamentais para a compreensão da história da capital paraense: “O Bi-Secular Palácio de Landi” (1973) e “Landi, Esse Desconhecido” (1976), ambos dedicados ao arquiteto italiano Antônio Landi; “Contribuição à História de Belém” (1974), “Evolução Histórica de Belém do Grão-Pará” (1975), “Contribuição à História da Pintura na Província do Grão-Pará no Segundo Reinado” (1975), “Antonio José de Lemos – o Plasmador de Belém” (1978), “Mosqueiro Ilhas e Vilas” (1978). Augusto Meira Filho faleceu em 1980, quatro anos após ver realizado um sonho que perseguiu durante trinta anos de sua vida: a inauguração da rodovia que tem o seu nome e da ponte sobre o Furo das Marinhas que liga a ilha do Mosqueiro ao continente.

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FONTES: MEIRA FILHO, Augusto. “Mosqueiro Ilhas e Vilas”- ED. GRAFISA, 1978- pp. 571, 572, 573, 574, 575 e 576

http://vereadoravanessa.blogspot.com/2011/02/augusto-meira-foi-homenageado-pela.html

terça-feira, 29 de novembro de 2011

NA ROTA DA HISTÓRIA: A RELÍQUIA PERDIDA

 

Autor: Claudionor Wanzeller

 

 

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FONTE: http://www.eujafui.com.br/3405870-belem/21215-ilha-de-mosqueiro/fotos/

Sábado, 26. Pesadas nuvens cobrem a ilha, escurecendo a tarde. Chove forte sobre a Vila centenária. O clarão dos relâmpagos parece fotografar a cena. O ribombar dos trovões estremece as casas e as pessoas.

De repente, um raio corta o cinzento do céu e atinge, em cheio, o antigo relógio no topo do Mercado Municipal, fazendo em pedaços mais de meio século de História.

Sim, o mesmo e tenaz relógio que Pires Teixeira doou em sinal do seu amor pela Ilha. O relógio que, nos velhos e silentes tempos, marcava a rotina do povo das redondezas: as horas mortas do meio da noite, o momento de entrar na fila da carne na época da guerra, a partida saudosa do navio, a pausa no trabalho para o almoço e a hora solene do Angelus.

O mesmo relógio cujas badaladas precisas cresci ouvindo e minha mãe e minha avó tantas vezes escutaram. Sons tão familiares como os apitos da velha Usina e do navio da linha.

É como se aquele raio quisesse parar o tempo: o presente com o cheiro do passado. Pessoas já se foram, o relógio já se foi, mas o tempo não para!

JANELAS DO TEMPO: MOLECAGENS DO PASSADO 2

Autor: Augusto Meira Filho

“Em uma das viagens de Belém para o Mosqueiro, pelo Alexandrino, os dois Joseph e Alexandre Farah, em companhia de colegas do mesmo tipo e padrão, resolveram criar o que chamaram de homem-bosta. Desejavam apurar como os cavalheiros austeros das mansões nobres do Mosqueiro se comportavam diante dessa palavra e dessa coisa hedionda que se chamava bosta!

O que fizeram, para obter uma resposta à sua indagação filosófica e moral?

Reuniram em vasilhame próprio uma porção de trampa e, quando todos dormiam, eles, aos pares, colocariam tal material nos portões das casas, nos trincos, nas maçanetas, dificultando seu uso. Quem conheceu o Mosqueiro daquele tempo sabe que os ônibus da Prefeitura passavam de madrugada, para o transporte de passageiros que se destinavam ao navio e a Belém. Esses veículos paravam em frente de cada vivenda, apanhando gente. Geralmente, mal acolhiam a freguesia de um bairro e estavam lotadíssimos. Ora! Quando eles chegavam à estrada do Farol, vinham cheios, sem lugar, e era um verdadeiro sacrifício tomar-se lugar naquelas circunstâncias.

Pois bem!

Os Farahzinhos e sua troupe infernal passaram fio de arame fino amarrando as folhas dos portões, impedindo, assim, que logo abrissem ao primeiro contato. Depois, como dissemos, aplicaram bosta em toda parte.

O pobre que se destinava a Belém, muitas vezes sem o café da manhã, mal colocava o casaco e apanhava a pasta de serviço, estava de espreita na passagem da viatura. Perdida, estava tudo liquidado. Raramente esses ônibus voltavam uma segunda vez para receber os retardatários. E foi isso que aconteceu a dezenas de veranistas, habitualmente fregueses, na madrugada, daquela espécie triste de transporte, da praia à Vila, quando saboreavam rapidamente um café no Lacerda ou no Padre Serra.

Imaginem os leitores de que essa meninada louca se dava ao prazer mórbido de acordar cedo para apreciar a desgraça alheia. O passageiro despedia-se às pressas da família e avançava para o portão. Fechado com arame, era difícil abri-lo com presteza. Vendo essa impossibilidade, o freguês pulava o muro sempre baixo e entrava apertado no veículo, causando a maior decepção. Suas mãos estavam cheias de merda, exalando cheiro desagradável. E não havia como lavar a imundície e era impossível regressar a casa para tal fim. Nem lenço dava jeito. Cada qual queixava-se para o vizinho e imaginava-se de quem teria partido semelhante absurdo. Quem? Repetiam em uníssono: “Os Farahzinhos. São uns demônios neste local. Uma praga! Uma desgraça social!”

Acontece que era hábito normal dos moradores da redondeza comparecerem à Missa domingueira das 8 horas, na Capela do Chapéu Virado. Senhoras, moças, crianças, rapazes, cavalheiros jamais faltavam àquele compromisso religioso.

No domingo seguinte a esses fatos que contamos, sentiu a esposa de Raymundo Farah um completo descaso, desinteresse por sua pessoa, diferente das vezes anteriores, com certa repulsa das vizinhas e amigas. Claro que isso afetaria a distinta senhora que nada tinha a ver com o caso das madrugadas pestilentas, comentadas em toda parte. Chegando a casa, chamou o marido reservadamente e expôs-lhe o fato ocorrido, lamentando-o, constrangida, e achando que as molecagens dos meninos estavam metidas nisso. Como sempre, o esposo discordou. As ‘meninas” eram inocentes. Perseguição da oposiçon, nada mais. Oposiçon! Sim! Oposiçõn!

Os dois, conhecendo o temperamento da genitora, deram um jeito de escutar a sua queixa, escondidos no quarto contíguo ao local do encontro. Ficaram matutando, preocupados, duplamente. Pela verdade do que ela dissera e pela ingenuidade patente do pai sempre negando as travessuras dos filhos gêmeos.

Cedo veio a ideia de apagar da história as dúvidas da mãe sem prejudicar o pensamento do pai. Concordaram, naquele mesmo instante, de efetuar a mesma operação no portão de sua própria casa. Assim, o velho Raymundo participaria da desgraça imunda imposta aos seus vizinhos e ficaria claro que os filhos nada tinham com a estória da merda nos muros. Não fariam aquilo com seu genitor. Sim!

Assim pensado, assim feito!

Na manhã de segunda-feira, o Sr. Farah viveria o mesmo vexame da vizinhança. Ao sair da casa velha, apressado, deixando a esposa no terraço, daria com as mãos num monte de bosta, colocado nos trincos, nos portões, em toda parte do muro antigo de sua vivenda tradicional. Ele não perderia a linha. Ao contrário, sentindo o mal realizado, retornou correndo com as mãos estendidas, dizendo à esposa que já estava aflita com aquele inesperado retorno:

-- Veja, dona Lordes, olhe aqui nas minhas mãos. Quanta imundície! Borraram o portão de fora, e isso é uma prova do que afirmei. Não foram nossas “meninas” que fizeram aquelas molecagens aí pelo Farol. São inocentes. Sim, dona Lordes, eu tinha razão. Mas vou agora apurar quem fez isto aqui no Mosqueiro. É o cúmulo, o máximo da falta de educação, de respeito aos moradores do bairro.

Foi desse modo – caros leitores – que Alexandre e Joseph livraram-se do problema e ainda confirmaram sua confiança naquele pai admirável que nunca aceitou suas malandragens.”

(Meira Filho, Augusto – “Mosqueiro Ilhas e Vilas”, Grafisa Ed., 1978, págs. 374, 375 e 376).

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

JANELAS DO TEMPO: O COMANDANTE ERNESTO

Autor: Cândido Marinho da Rocha

“O “Almirante Alexandrino”, pequeno navio a vapor que fazia a ligação diária entre Belém e a Ilha, deixava a capital às 4 horas da tarde, chegava ao Mosqueiro mais ou menos às 6,30, lá passava a noite para regressar no dia seguinte às 6 da manhã. Aos domingos e feriados, zarpava de Belém às 6 da manhã, regressando do Mosqueiro às 5 da tarde. Assim por muitos anos.

Um dos mais notáveis comandantes do pequeno barco, de nome Ernesto Dias, modesto marinheiro, muito relacionado entre os frequentadores e habitantes da ilha, tem, hoje, uma rua com seu nome. O Comandante Ernesto conhecia a vida de cada um dos passageiros e dava aqui uma palavra a uma senhora idosa, ali ajudava uma jovem mãe a resolver os problemas do garotinho que levava nos braços, oferecia seus serviços a qualquer figurão que viajasse, palestrava com os rapazes, lembrava episódios com os conservadores, seus contemporâneos políticos.

Ernesto Dias era de pequena estatura, amorenado, esguio, afável, mas dirigia com energia o navio, cuja tripulação lhe devotava respeito e admiração. Tanto que, por muitos anos, foi o comandante do “Almirante Alexandrino”, até que a morte o colheu. Perfeito nas manobras de aportamento, nunca albaroou seu barco com os cais quer de Belém quer do Mosqueiro. Era mesmo famoso por suas manobras e se tornou durante algum tempo motivo de curiosidade a forma suave, elegante, lenta e segura com que encostava o “Almirante Alexandrino”, aproveitando as vantagens do vento e da maré. Nunca errou um cálculo de atracação, nunca foi obrigado a fazer o navio circundar o porto, em manobras frustradas, repetidas e morosas.

Naquela madrugada de Junho o navio, sob a balsâmica aragem mosqueirense, puxava fogo nas caldeiras, preparava-se para deixar a ilha rumo a Belém. Chovera durante toda a noite, as folhas das árvores que pendiam sobre as praias como que choravam inutilmente, por cima da areia, que sorvia aquelas lágrimas vegetais, num velho e indiferente hábito.

Os passageiros, que se destinavam a Belém, passavam apressadamente pela Praça da Matriz, uns embuçados em capas, outros protegidos por guarda-chuvas e os mais desprevenidos acobertando as cabeças com jornais velhos. O navio dava o último apito, avisando a partida. Faltavam dez minutos para largar com destino a Belém.

À proa, braços cruzados, cigarrinho pendido à boca, o comandante Ernesto dava ordens para a desatracação.”

(FONTE: MARINHO ROCHA, Cândido. “Ilha Capital Vila”- GRÁFICA FALANGOLA EDITORA. Belém-Pa, 1973- pp. 35 e 36)

MOSQUEIRANDO: A Travessa Comandante Ernesto Dias foi a rua onde vivi a maior parte da minha infância. Ali nasci e cresci até os nove anos de idade, vendo os carros de boi passarem a custo e os poucos ciclistas, retidos pelas fartas areias, obrigados a descerem de suas pesadas bicicletas do tempo da guerra. E como esquecer as festas no Pedreira E. C., quase em frente de casa, ou a movimentação no Partido (sede do PSD), em tempos de política? Como não lembrar o Bloco da Vitória, durante o carnaval? Ou a passagem do tradicional Mastro de São Pedro e, em noites iluminadas pelas fogueiras juninas, do boi-bumbá Pai do Campo? Ou o foguetório da disputa saudável e alegre entre o alvi-celeste Mundiquinho Bastos e o azulino Álvaro Mello, em dias de RE-PA? Impossível! São recordações que marcam uma vida! Essa rua, uma das primeiras da Vila, já foi chamada de Rua das Mangueiras, quando variadas espécies desse vegetal ocupavam seu leito. Depois que as frondosas árvores foram substituídas pelos trilhos do bondinho, foi denominada Travessa do Bispo, pois tem início naquela praia. Hoje, ostenta orgulhosa o nome do valoroso comandante do Alexandrino

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

CANTANDO A ILHA - MARAHU: Primeira Relação

Autor: Max Martins

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Foto: Paula Sampaio

MARAHU: Primeira Relação

 

2 formigas - operárias
ápteras
ou novatas, não
de fogo mas
noturnas, doces
1 grilo
(depois aprisionado
pela aranha, morto
ao amanhecer).
O canto dum galo
e outro galo.
A saracura. A tarde.
2 gaviões molhados
encolhidos no pau da árvore
pensos.
Garças
sobre as pedras
negras da praia.
Os urubus
o boto morto
um cão medroso, sapos
sapos
sapos
1 goteira
sapos
chuva
o sol
vindo do mato
às 7
da manhã.
A noite
a escuridão o vento as velas
de Lao-tsé
Thoreau
e o meu cajado de bambu rachado
o chão
folhas úmidas.

O autor:

"A minha poesia tem uma relação muito veemente com a vida.
É poesia-vida, vidapoesia".
(Max Martins)

Max Martins nasceu em Santa Maria de Belém do Grão Pará em 1926. A partir de 1934, fez estudos nas áreas de Poesia, Artes, Literatura e Filosofia, nunca abandonando a formação autodidata.

Os primeiros textos de Max foram publicados por Haroldo Maranhão em um jornal escolar denominado “O Colegial”. Foi a partir desse jornal de alunos, que floresceu uma amizade entre Max, Haroldo e Benedito Nunes que dura mais de 50 anos. No período de 1945 a 1951, eles participaram juntos do suplemento literário “Folha do Norte”, de grande importância na época.
Ao lado de Benedito Nunes, Francisco Paulo Mendes, Rui Barata, Mário Faustino, Paulo Plínio de Abreu, Haroldo Maranhão, viu chegar a modernidade na poesia brasileira, da qual se tornou um dos poetas mais expressivos. Sua obra está traduzida para o alemão, inglês e francês.

Sua poesia é transgressão, é ruptura, é um fora na mesmice, é espelho para os novos poetas.

Livros publicados: O Estranho, 1952; Anti-Retrato, 1960 — ambos de poesia. Tanto o primeiro como o segundo livro receberam respectivamente os prêmios da Academia Paraense de Letras e Secretaria de Educação do Estado do Pará; H'Era, 1971; O Ovo Filosófico, 1976; O Risco Subscrito, 1980; A Fala entre Parênteses, 1982 — em parceria com o poeta Age de Carvalho; Caminho de Marahu, 1983; 60/35, 1985; Não para Consolar— Poesia Completa — Prêmio Olavo Bilac da ABL, dividido com o poeta António Carlos Osório, 1992; Para Ter Onde Ir, 1992; Colmando a Lacuna — Poemas Reunidos, 1952-2001.

Max Martins é dos mais instigantes, vale ouvir, vale a leitura, vale a reflexão.

O mundo das letras se despede de um dos maiores poetas brasileiros de todos os tempos, o poeta Max Martins. Max morreu no final da tarde de 9 de fevereiro de 2009, aos 82 anos. O legado poético que fica, eternizado por versos de finas estampas, é o de um gênio da palavra que fez da poesia um ato de resistência.

Mas poeta não se despede, e nem morre...

FONTES: http://academiadospoetasparaenses.blogspot.com/2009/01/poesia-de-benilton-cruz.html

http://academiadospoetasparaenses.blogspot.com/2009/02/morre-o-poeta-max-martins.html

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

JANELAS DO TEMPO: DE VOLTA AOS NAVIOS DO PASSADO

Autor: Cândido Marinho da Rocha

“Para a indignação do jovem pintor Garibaldi conspirava a morosidade daquelas viagens. Quando, nos dias de maior movimento, que aconteciam ao se seguirem dois ou mais dias inúteis – feriados unidos ou anexos a sábados e/ou domingos – ou no dia do Círio de N. S. do Ó, padroeira da localidade, dois navios (às vezes até três) eram destacados para fazer o transporte dos fiéis. Um era, necessariamente, o “Almirante Alexandrino” construído em 1905, que tinha capacidade apenas para cerca de seiscentos passageiros, embora, certas vezes, recebesse mais de oitocentos. Outro era um largo e raso navio conhecido pelo nome de “chata” por ter o calado menor que os demais de sua envergadura e o casco chamado de “fundo-prato”. “Fortaleza”, “Belém”, “Belo Horizonte” eram seus nomes. Construídos em 1913, podiam transportar cerca de 250 passageiros alojados e 700 em pé. Para vencer as vinte e quatro milhas que separam Belém do porto da Ilha do Mosqueiro, a “chata” necessitava de quatro a cinco horas. Navios apropriados a longas viagens, eram dotados de muitos camarotes, pelo que não sobrava espaço disponível no convés, para alojamento de passageiros de curta viagem. O “Almirante Alexandrino”, mais leve, tendo sido transformado em navio de recreio para servir exclusivamente às viagens de Mosqueiro e Soure, era dotado de inúmeras cadeiras, que ofereciam maior comodidade ao passageiro, assim como conseguia alcançar Mosqueiro com duas horas de viagem. Contra a maré, o tempo aumentava, reduzido, naturalmente, se a viagem se fazia a favor da corrente”.

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A “chatinha” que fazia viagem para a Ilha (FONTE: MEIRA FILHO – 1978)

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Vapor Almirante Alexandrino (FONTE: A. MEIRA FILHO – 1978)

Todos os navios eram dotados de bar, onde se encontrava toda sorte de bebida. O ponto predileto da rapaziada ao redor daquele enorme balcão, atrás do qual diligentes moços serviam os sequiosos passageiros. Depois de uma ou duas horas de viagem, a conversa já era ruidosa, gargalhadas, anedotas, o diabo acontecia junto ao bar. Discussões a propósito do futebol, da mulher, do jogo do bicho, da guerra, da política, menos do Amor. De modo que ao chegar o navio ao Mosqueiro alguns já se encontravam conscientemente embriagados, falantes, exigentes, imprudentes, problemáticos. A roda habitual dos cervejófilos era quase sempre a mesma, todos conhecidos, que assim procuravam esquecer a tortura daquelas viagens sem fim, as máquinas a puxarem cinco milhas horárias.

Famílias que levavam crianças passavam mal. Faziam fila à porta dos banheiros – Cavalheiros, Senhoras – para que os garotos pudessem satisfazer suas desidratações. Enquanto esperavam, alta era a choradeira, os berros das amas indignadas, ali humilhadas perante os olhares de censura dos demais passageiros circunstantes. A confusão crescia, ajudada pelos grupos de moças e rapazes a cantarem com acompanhamento de abomináveis e chocalhantes violões, batidas de latas vazias. Lá adiante, roufenha vitrola explodia discos esganiçados enchendo o ar de poluídos sons. Os que ocupavam cadeiras – e para isso precisavam estar a bordo duas horas antes da partida, o que aumentava o tempo para cinco e mais horas de viagem – espremiam-se sufocantemente, fatigados da posição, amaldiçoando a hora em que se decidiram ir ao Mosqueiro. Amigas trançavam assuntos por cima das cabeças dos poucos que desejavam cochilar, armavam competições a propósito da competência de cada marido, acabando por confessar, desesperadas, as próprias mazelas das filhas e dos parentes. Um inferno! Uma que outra escaramuça surgia entre embriagados, exacerbados pela intervenção do pessoal acomodatício, entre os quais, quase sempre, saía um machucado. Sentados em cadeiras de lonas, e que faziam sistema com os proprietários, pois ora estavam à proa, ora à ré, ora à meia-nau, passageiros tradicionais choravam reminiscências. Tempos do “Velho Lauro”, do “Velho Lemos”, do Augusto Montenegro, do Enéas Martins, tempos inesquecíveis de civismo, diziam, saudosistas. Tempos de augustas escamoteações eleitorais, pensavam, envergonhados. Tempos em que se andava de “croisée” nas ruas de Belém, como o Dr. Virgílio de Mendonça, o comendador Candido Costa, o comendador Pinho e outros. Tempos em que médico tinha pejo de usar roupa comum. Aquilo sim que era pundonor profissional, diziam, resmungantes. Tempos da Sociedade do Descanso no Largo de Nazaré. Ah! Tempos sem pressa, Deus do Céu! Outros, mais vivos, menos mortos, relatavam diabruras sexuais, conquistas intermináveis. Recordavam mulheres soberbas, como haverá jamais. Nunca ninguém conquistou gente feia! Tudo belo, bonito, perfeito, puro e gostoso, como na poesia de Fernando Pessoa. Tudo princesa, duquesa, riqueza, limpeza!

Na altura da ilha de Tatuoca começavam a dormitar os velhotes, vítimas das próprias mentiras. Mas ou autênticos, os mentirosos de raça, continuavam a mentir, galhardamente, teimosamente, como o navio em que viajavam. Sem pressa.

Entre os campeões da pabulagem destacavam-se o Lisboa e o Candoca. Aquele era maquinista aposentado, conhecedor deste e do outro mundo. Este era vendedor de promessas, isto é, agente de seguros de vida. Prometia a vida vendendo a morte, o trapalhão. Eram competidores permanentes. Sátiras políticas, maledicência geral, forgicadores de anedotas atribuídas a pessoas conhecidas, tudo servia para as disputas. Mais que Paulito conheciam a vida de todas as mais notáveis pessoas de Belém. Hábitos íntimos, vícios, concubinas, renda mensal, religião, terreiros que frequentavam, “serviços” de macumba para conquistas amorosas, clube predileto, idoneidade, quantos filhos em casa, quantos fora de casa, mulheres falsas, moças fraudulentas, abortos, concessões, aberrações, nas minúcias, nas particularidades.

Espantosos, os velhotes!”

(FONTE: MARINHO ROCHA, Cândido. “Ilha Capital Vila”- GRÁFICA FALANGOLA EDITORA. Belém-Pa, 1973- pp. 188, 189 e 190)

sexta-feira, 18 de novembro de 2011

NA ROTA DO TURISMO: ELEIÇÃO PELO PÚBLICO DAS 7 MARAVILHAS DO PARÁ

 

Durante a premiação da sétima edição do Prêmio ORM/ACP, na noite desta quinta-feira (17), no Hangar Centro de Convenções e Feiras da Amazônia foram divulgados os nomes das '7 Maravilhas do Pará', uma promoção realizada pelo jornal O Liberal, por meio de votação popular. Foram eleitos também mais três ícones paraenses devido à expressiva votação.

Conheça as '7 Maravilhas do Pará':


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                Igreja de Pedra de Vigia (Foto: Ray Nonato)

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          Parque Ambiental de Paragominas (Foto: Antônio Silva)

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                     Praia do Atalaia (Foto: Henrique Felício)

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                           Alter do Chão (Foto: Ray Nonato)

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                         Círio de Nazaré (Foto: Ray Nonato)



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                       Ilha de Mosqueiro (Foto: Ray Nonato)

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              Parque Zoobotânico de Carajás (Foto: Agência Vale)

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                                 Ver-o-Peso (Foto: Igor Mota)

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                           Theatro da Paz (Foto: Elivaldo Pamplona)


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                Complexo Feliz Lusitânia (Foto: Oswaldo Forte)

FONTE: http://nossomeioambiente01.blogspot.com/2011/11/conheca-as-7-maravilhas-do-para-eleitas.html#more

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

NA ROTA DO TURISMO: BELEZINHA

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Balneário BELEZINHA na Rod. Augusto M. Filho (GOOGLE EARTH, 2011)

Quem chega à ilha do Mosqueiro pela Rodovia Augusto Meira Filho, após atravessar a ponte Sebastião R. de Oliveira e pouco distante do Furo das Marinhas, vai encontrar, à direita, um aprazível balneário, refúgio para aqueles que, em dias de grande movimento, fogem das praias repletas de banhistas. É a hora de trocar o banho nas ondas doces do rio-mar Pará pelo mergulho nas águas tranquilas, escuras e geladas do Belezinha, as mesmas águas que envolveram o corpo escultural da atriz Cláudia Raia, durante a gravação de cenas para uma telenovela.

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Além do aconchego do lugar, as reconfortantes águas do Belezinha, uma das nascentes do rio Mari-Mari, são recomendadas para espantar o sono ou curar as indisposições causadas pelo excesso de bebidas alcoólicas. Sem dúvida, é um ponto turístico da ilha!

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FOTOS: Wanzeller, 2011

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

JANELAS DO TEMPO: NA ÉPOCA DOS BONDINHOS

Autor: Cândido Marinho da Rocha

 

“A Ilha naqueles tempos quase que se resumia à Vila, onde casas nobres floresciam como as dos senhores Frazão, Comandante Solano, Souza Filho, Inácio Nogueira, Prisco dos Santos, Batista Moreira, Alcindo Cacela, Ó de Almeida, bem como outras menores.

À Praia do Chapéu Virado ia-se em bondinhos puxados a burros, a cavalo, ou acionando as próprias pernas.”

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          Bondinho puxado a burro (FONTE: A. MEIRA FILHO, 1978)

“E era divertida a viagem, embora morosa, os animais puxando os bondinhos sobre os trilhos, já decadentes. O caminho era estreito, as ramagens tocavam os passageiros. Chapéu Virado bairro longínquo, praia apenas para turistas e veranistas mais abonados. Pescadores ali moravam, poucos lavradores, que o povo de Mosqueiro não se dava muito ao cultivo da terra. Pouco se ouvia falar em Morubira, Ariramba e Carananduba, sítios distantes, praias, rios, matos, ótimos para caçadas e pescarias. Um que outro, mais corajoso, lá mandava construir uma casa.

O Hotel do Chapéu Virado era um grito avançado lá dentro da Ilha, ao lado da bela praia do mesmo nome. O Hotel do Zacarias, no Farol, era uma audácia sem conforto e sem frequência. Mas seus proprietários, teimosos, previdentes, corajosos – insistiam em oferecer pousada a quem quisesse realmente repousar naqueles ermos.

Luz elétrica pública não havia por assim dizer; água saía dos poços como, ainda hoje, cristalina, limpa e permanente.”

“Para assentamento de trilhos na Ilha do Mosqueiro a Lei Municipal nº 216, de 29 de dezembro de 1898 deu a concessão a João Evangelista Ferreira da Motta. Esta concessão foi transferida a Antonio Pindobussú de Lemos pela Lei nº 328, de 2 de abril de 1902. Assim, em 1931, os trilhos já não eram novos nem os bondes também. Estes eram deliciosos, lentos e prudentes, incapazes de ferir alguém, como aconteceria tempos depois, quando os automóveis tivessem tomado conta da praça.

Carananduba, cuja planta foi levantada em 1901, para que a localidade se transformasse em povoação, com todas as condições materiais de higiene, era lugar remoto e habitado por gente pouco conhecida na Vila.

Tudo isso consta do Relatório do Senador Antonio José de Lemos, Intendente de Belém, e referente aos anos de 1897 a 1902.”

“Pomares existiam fartos, com frutas de todos os tipos como abiu, cupuaçu, abacate, cutite, abricó, uxi, pupunha, mamão, graviola, goiaba, araçá, biribá, sapotilha, manga (grandes, copadas e veneráveis mangueiras), jambo, ajuru, murici, e tantas outras frutas silvestres.

Enormes terrenos eram propriedades doadas pelos governos de então, como para estimular o desenvolvimento e ocupação das terras. No bairro do Ariramba, por exemplo, o governador Augusto Montenegro doou extensa e profunda faixa de terra aos Marcelinos.

À sombra desses pomares, às tardes mornas da Ilha, muitos amores nasceram, floresceram e frutificaram. Quase sempre os casamentos eram consequências do namoro de jovens que não resistiam e se ofereciam à atmosfera amorosa do Mosqueiro, à embaladora brisa vespertina, à proteção das trevas noturnas das ruas sem luz ou à beleza das noites de lua cheia, verdadeiro grito de amor sobre a doce Ilha afrodisíaca.”

(FONTE: MARINHO ROCHA, Cândido. “Ilha Capital Vila”- GRÁFICA FALANGOLA EDITORA. Belém-Pa, 1973- pp. 21, 22, 23 e 24)

O AUTOR:

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           Cândido Marinho da Rocha ao microfone (FONTE: APER)

Cândido Marinho da Rocha nasceu em 14/06/1907, em Belém do Pará, filho de João Cândido da Rocha, e Maria Marinho da Rocha, ele vindo do Rio Grande do Norte e ela do Ceará.

Em 30/11/1933, contraiu núpcias com a Sra. Elizabeth de Souza Rocha, filha de Antônio de Souza Filho e Francisca Nepomuceno de Souza, de cujo matrimônio nasceu seus três filhos: Omar de Souza Rocha, dentista, sócio da firma C. M. Rocha Irmãos & Cia Ltda; Maurício de Souza Rocha, médico; e Luiz Carlos de Souza Rocha, engenheiro civil.

Fez o curso primário no Externato São Tomaz e no Grupo Escolar Wenceslau Brás, o Curso Secundário no Instituto Nossa Senhora de Nazaré, ingressando aos 15 anos de idade na Academia Livre de Comércio, mantida pela Fênix Caixeiral Paraense, onde, no ano de 1926, aos dezenove anos de idade, concluiu o Curso de Contabilista.

Além do curso de Contabilista, fez o curso de Técnico em Conferências e Curso de Preparação de Oficiais da Reserva (CPOR), tornando-se Oficial R2 do Exército Brasileiro. Foi, também, Professor do SENAC – Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial, na área de Metodologia.

Ainda em 1922, portanto com 15 anos de idade, embora trabalhando no comércio, começou a publicar os seus primeiros contos e crônicas nos grandes jornais de Belém, já com um estilo inconfundível, como jornalista e escritor.

Em 1930, quando ainda contava com 23 anos de idade, fundou e foi o redator do semanário “O Auxiliar do Comércio”, através do qual lutou pela instituição de oito horas de trabalho e da semana inglesa.

Prosseguiu colaborando com revistas e diários de Belém, entre as quais a “Revista Amazônia” até que, em maio de 1958, foi eleito membro do Instituto Histórico e Geográfico do Pará, lançando um ano depois o seu primeiro livro de contos “Terra Molhada”, que mereceu Menção Honrosa da Academia Paraense de Letras.

Nessa condição de escritor, colaborou com o Semanário “A Colônia”, órgão informativo da Colônia Portuguesa, dirigida pelo jornalista português J. Godinho Ferreira; com a revista “A Phênix”, informativo da Fênix Caixeiral Paraense, dirigida pelo saudoso mestre Ramiro Castro, de grande circulação regional e destacada entre as melhores revistas da época. A partir de 1926 passou a publicar contos e crônicas, sua especialidade, nos Jornais: “O Estado do Pará”, “A Província do Pará”, “Folha do Norte,” e “O Liberal”.

Seus principais livros, como escritor foram: “Terra Molhada” – contos, editado em 1959 e reeditado em 1962; “Vila Podrona”- romance editado em 1964; “O Defunto Homem” – romance e novela, editado em 1968 pela Editora da Universidade Federal do Pará em continuação à “Vila Podrona”; “Ilha, capital Vila” – romance e novela, editado em 1973, falando sobre a Ilha de Mosqueiro; “Menino do Marajó” – romance e novela, editado em 1976; “Biografias Maçônicas Paraenses”, editado em 1978; “Tijuco, Leite de Amores”, editado em 1975; e “As Viúvas”, romance e novela editado em 1979.

Foi Presidente, Vice-Presidente, e Presidente do Conselho Deliberativo da Fênix Caixeiral Paraense, e foi membro do Instituto do Ceará e da Ordem dos Velhos Jornalistas do Rio de Janeiro.

Com seu idealismo transparecendo em todos os momentos da sua vida, fez parte de um grupo de intelectuais que fundou o NORTE TEATRO ESCOLA DO PARÁ, onde exerceu o cargo de Diretor Administrativo, e a FACULDADE DE CIÊNCIAS CONTÁBEIS E ATUARIAIS DO PARÁ, onde exerceu a Presidência, depois incorporada à Universidade Federal do Pará.

Destacou-se como Presidente da Associação Paraense de Seguros, cargo que assumiu, coincidentemente, no “Dia Continental de Seguros”, fato destacado em brilhante discurso proferido no dia 14 de maio, ao lado do nosso confrade Jorge Germano Silva que, na condição de Vice-Presidente, acabou recebendo, mais tarde, o honroso cargo de Presidente, através de atenciosa correspondência de 04/04/1979 de Cândido Marinho da Rocha.

Dezoito anos antes, em Sessão Magna realizada no dia 14/06/1961, aos cinqüenta e quatro anos de idade, tomou posse na Cadeira nº 1, da Academia Paraense de Letras, que tem como Patrono Arthur Otávio Nobre Viana, um dos fundadores da Academia, cadeira ocupada também por Manoel Lowton Taveira Lobato, Adalberto Santos, e Rafael Costa, e hoje ocupada pelo acadêmico Ivanildo Alves. O seu discurso de posse, que denominou “O Paraensismo”, foi publicado no mesmo ano, sob os auspícios do Governador Aurélio do Carmo. Na Academia Paraense de Letras, exerceu o cargo de Tesoureiro, e Presidente no período de 1970 a 1974.

Nesse período, Cândido Marinho da Rocha proferiu inúmeras palestras e conferências, abordando temas históricos e literários, todos publicados na Revista da Academia Paraense de Letras e do Instituto Histórico.

Quando em 2008, dentro do projeto “Belém da Memória”, implantado no ano de 1999 pelo Núcleo Cultural – Casa da Memória da Universidade da Amazônia, a UNAMA homenageou a Loja de Tecidos “Paris N´América”, situada na Rua Santo Antônio, bairro da Campina, a placa comemorativa continha fragmentos do texto “Pour monsieurs et madame”, de Cândido Marinho da Rocha, em que é relatado, em detalhes, uma das épocas de maior prosperidade econômica de Belém, que resultou na criação das arquiteturas mais luxuosas da cidade. O projeto “Belém da Memória” inspirou-se nos discursos de nossos escritores e fixou em vários pontos da cidade, placas padronizadas que reproduzem esses textos ilustrados por imagens e ícones do patrimônio arquitetônico da cidade, sendo o texto de Cândido Marinho da Rocha escolhido por representar a realidade que Belém vivia nos anos da “Belle Époque”, principalmente a moda da alta sociedade, sempre inspiradas nas tendências européias, descrevendo como as moças se vestiam, como eram as sedas e os tecidos finos que chegavam a Belém.

O seu valor como escritor, foi destacado em alguns depoimentos, dos quais se destaca:

* Salomão Laredo, no texto escrito em julho de 2004, denominado “FEIRA DO LIVRO, LEANDRO E DALCÍDIO”, cita Cândido Marinho da Rocha como um dos expoentes da literatura paraense, com produção de qualidade, ao lado de Sílvio Meira, Ignácio Moura, Bruno de Menezes, Eustachio de Azevedo, Clóvis e Cécil Meira, Rodrigues Pinagé, Lindanor Celina, Ruy Barata, Victor Tamer, Georgenor Franco, Silvio e Levy Hall de Moura, Ernesto Cruz, Domingos Antônio Raiol, José Guilherme de Campos Ribeiro, Osvaldo Orico, Carlos Rocque, e tantos outros de grande importância na literatura paraense.

* Em “Narrativas da Ilha do Mosqueiro”, Cândido Marinho da Rocha é citado várias vezes, ao lado de Meira Filho, Claudionor Wanzeller, ressaltando a obra “Ilha, Capital Vila”, de sua autoria, que retrata o seu carinho e admiração pela Vila do Mosqueiro.

A sua admiração pela Vila do Mosqueiro era tão grande, a ponto de entrar na discussão sobre o nome das suas praias, citando 17 praias (1972), enquanto Meira Filho cita 21 (1978), Lairson Costa cita 20 (2005) e Maria da Paz cita apenas 15 (2000). Entra, também, na discussão sobre a grafia do nome de uma das praias de Mosqueiro, se Marahú ou Maraú, em que emite a sua opinião abalizada. Cita-se como uma das razões dessa admiração por Mosqueiro, é que foi lá que conheceu a sua esposa e companheira Elizabeth. Dessa sua ligação com Mosqueiro, nasceu a Biblioteca “Cândido Marinho da Rocha” que, por muito tempo, funcionou com um rico acervo literário naquela localidade.

Na área comercial, em 1938, fundou e foi sócio das firmas C. M. Rocha, Irmãos & Cia Ltda, e M. Rocha & Cia, especializadas em seguros e equipamentos científicos. Foi membro do Conselho Superior da Associação Comercial do Pará, e foi agraciado com o Título de “Honra ao Mérito” concedido pela Câmara Municipal de Belém.

Participou ativamente da elaboração do primeiro plano de eletrificação do Estado do Pará, e, por volta de 1957, da fundação das Empresas Geradoras e Distribuidoras de Energia Elétrica do Pará, depois Força e Luz do Pará, hoje Centrais Elétricas do Pará – CELPA, das quais foi Diretor Comercial e Presidente.

No esporte, foi remador do Paysandu Sport Club – PSC, no período de 1932 a 1933, chegando a exercer os cargos administrativos de Tesoureiro, e Vice-Presidente do Conselho Deliberativo.

Na Maçonaria, se destacou como obreiro ativo e líder maçônico, iniciando os seus estudos maçônicos em 19/12/1940 (1º grau) na Loja Maçônica Renascença nº 3, onde foi elevado (2º grau) em 11/03/1941, exaltado (3º grau) em 20/05/1941, exercendo os cargos de Orador e 1º Vigilante (1946/1947), Membro da Comissão de Finanças (1949/1950), chegando a Venerável Mestre, no período de 1950 a 1952, e agraciado, em 01/04/1971, com o Título de Grande Benemérito da Loja. No período de 1957 a 1964, assumiu o cargo máximo de Sereníssimo Grão-Mestre da Grande Loja Maçônica do Pará - GLEPA, permanecendo no cargo durante 9 anos, período em que teve grande participação na fundação da Grande Loja Maçônica do Maranhão – GLEMA, concedendo a sua Carta Constitutiva em 1960. Em reconhecimento aos trabalhos desenvolvidos na maçonaria, o seu nome foi perpetuado na Loja Maçônica Cândido Marinho da Rocha nº 62, fundada em 14/06/1986, pertencente à Grande Loja Maçônica do Pará. Em uma das últimas homenagens prestadas, ao completar dez anos do seu falecimento, a Revista “O Maço” deu destaque ao acontecimento, dizendo ser o nosso patrono “um dos grandes vultos da Maçonaria do Pará que, ao transferir-se para o Oriente Eterno deixou para todos nós uma invejável folha de serviços prestados à Ordem”.

No Rotary participou intensamente das atividades rotárias como sócio Veterano do Rotary Club de Belém Nazaré, onde ingressou no dia 12/10/1960. Na sua trajetória no clube, exerceu os cargos de Diretor das Avenidas de Serviços Profissionais (1963/1964), Serviços Internos (1974/75), Presidente de várias Comissões e Subcomissões, ininterruptamente, Vice-Presidente (1964/65), 1º Secretário (1966/67), Presidente no ano rotário 1969 a 1970, período em que foi Representante Especial para Fundação de Novos Clubes em Belém, e Membro da Comissão Consultiva Distrital. No período 1972-1973, na gestão do Governador do Distrito Antônio Gomes Moreira Jr., foi Presidente da Comissão Distrital da Casa da Amizade e membro 6 da ACADEMIA PARAENSE DE ESTUDOS ROTÁRIOS – APER da Comissão de Resoluções na Conferência Distrital de 13 a 15/4/1973, participando, ainda, da fundação de vários clubes no Distrito.

A sua dedicação ao Rotary e à Maçonaria, fundamentada no “Ideal de Servir” e “na tolerância, respeito e o amor fraternal” estimulou o seu filho Luiz Carlos, a ingressar, também, no Rotary Club de Belém Nazaré, e a ser membro ativo da Loja Maçônica Cândido Marinho da Rocha nº 62.

Cândido Marinho da Rocha faleceu em 15 de novembro de 1985, com 78 anos de idade.

FONTE: ACADEMIA PARAENSE DE ESTUDOS ROTÁRIOS – APER. BIOGRAFIA DE CÂNDIDO MARINHO DA ROCHA – PATRONO DA CADEIRA Nº 18.

http://www.glepa.org.br/controle/arquitetura/arquivo/10.pdf