terça-feira, 30 de dezembro de 2014

EVENTO FESTIVO: A PASSAGEM DE ANO

 

Há muito tempo, ainda em criança, vi uma folhinha (calendário) que trazia uma charge sobre a passagem de ano: o Ano Velho, um raquítico e maltrapilho velhinho de barba branca, era expulso a vassouradas pelo Ano Novo, um jovem forte e garboso.

Não sei se o cartunista foi inspirado pelo “homem da vassoura”, o candidato à Presidência do Brasil que, outrora, prometia varrer a corrupção e os corruptos de nosso país (Que ilusão!). Talvez o desenho fosse, também, uma espécie de vingança da juventude da época contra a rígida educação imposta pelos antigos. Não sei dizer.

Só sei que, na minha imaginação infanto-juvenil, via aquele velhinho como um Papai Noel injustiçado e desprezado logo após as festas natalinas. Acho que o sonho do presente foi realizado ou não. Posso dizer também que, apesar das homéricas surras que, na época, se levava pelos malfeitos impensados, nunca fui nem sou um revoltado contra a educação tradicional. Em verdade – dizem -- o sofrimento fortalece o espírito.

Sei, perfeitamente, que, pela ordem natural das coisas, o novo substitui o velho. Acredito, porém, que “expulsar o Ano Velho”, como se fosse ele culpado de nossos erros e fracassos e merecesse o esquecimento total, não é a melhor atitude, pois sem passado não existe presente.

É certo que a chegada do Ano Novo deve ser comemorada efusivamente, pela esperança de um futuro melhor que ele representa. Mas a despedida do Ano Velho também deve ser festejada com muito carinho, pois ele representa mais um ano de Vida, da nossa vida, da vida de nossos amigos e parentes.

Quanto ao que não foi satisfatório no ano que se vai, lembre-se de que erros e fracassos devem servir de aprendizado e constituem a experiência de vida tão imprescindível à construção dos nossos momentos de vitória e felicidade.

Que se vá o Ano Velho e que sejamos felizes e melhores no Ano Novo!

MOSQUEIRANDO: A vocês que nos seguiram ou, simplesmente, acessaram as páginas deste Blog em 2014, desejamos um Ano Novo de novas ideias e novas atitudes, de novas oportunidades e novas realizações, de novos amigos e novas alegrias, em um saudável ambiente repleto de muita paz, muito amor e muita Fé!

Feliz Ano Novo!

                                          Claudionor Wanzeller

segunda-feira, 29 de dezembro de 2014

EVENTO NATALINO: PROJETO “O AREIÃO ENCANTADO”

 

Idealizada pelas professoras Luciana Bittencourt e Emmanuelle Franco, a decoração natalina da praia do Areião, na Ilha do Mosqueiro, teve início em 2012 e, a cada ano, fica mais bonita com a profusão de luzes multicoloridas iluminando o magnífico trabalho artesanal de reciclagem das garrafas PET. Durante o mês de dezembro, o Areião Encantado torna-se um espaço mágico apropriado à visitação do público e à realização de eventos festivos, principalmente no Dia de Natal e no réveillon. Veja o registro fotográfico feito por Christopher Bahia:

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sábado, 27 de dezembro de 2014

PARODIANDO "WE ARE THE WORLD" : EU SOU PARÁ



COMPOSITOR: ALDAIR SANTOS

Essa música é uma paródia de "We are the world" e uma composição de Aldair Santos. Ela fala um pouco da Cultura Paraense e é cantada por Igor Ribeiro,Severino Neto e Aldair Santos. Tenho certeza que vocês vão adorar e nunca mais vão esquecer essa linda canção.

quarta-feira, 24 de dezembro de 2014

EVENTO RELIGIOSO: NATAL

 

NATAL

 

Vês aquela Estrela

Que brilha intensamente na escuridão?

Segue-a, pois será o teu guia

Na misteriosa viagem da Vida!

 

Segue aquela Estrela

e atravessarás obstáculos e infortúnios,

com a mesma Fé e determinação

que conduziram os Reis Magos,

na travessia do deserto!

 

Se a seguires,

não esquecerás o Amor e o Perdão,

a Fraternidade e a Misericórdia,

a Humildade e a Paciência.

 

Se a seguires,

encontrarás a Esperança

de um Novo Tempo,

pois Jesus renascerá em teu coração!

 

                          Claudionor Wanzeller

segunda-feira, 22 de dezembro de 2014

domingo, 21 de dezembro de 2014

CURIOSIDADES: FELIZ SOLSTÍCIO PARA TODOS!

 

Publicado por Fernando Munaretto

Hoje é o dia mais longo do ano para o hemisfério sul da Terra.

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Em 21 de dezembro, enquanto é meia-noite em Brasília, o Polo Sul da Terra permanece iluminado. Imagem: Google Earth.

Olá, pessoal!

Hoje é o dia mais longo do ano, bom momento para celebrar a vida.

O caminho aparente que o Sol percorre ao longo do ano em relação às estrelas de fundo, se chama linha da eclíptica. Hoje, dia do solstício de verão, o Sol ocupa o ponto da eclíptica mais afastado ao sul do equador, delimitado pelo trópico de Capricórnio, que passa por sobre o estado de São Paulo.

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Marco indicativo do Trópico de Capricórnio na cidade de Santana de Parnaíba, no estado de São Paulo.

Se observarmos sistematicamente a ascensão do Sol ao longo dos meses, perceberemos a diferença entre o ponto onde o Sol nasce em 21 de junho (solstício de inverno) e o ponto onde ele nasce em 21 de dezembro. Confira:

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Posição do Sol nascente em 21 de dezembro de 2014. Solstício de verão.

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Posição do Sol nascente em 22 de setembro de 2014. Equinócio de primavera.

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Posição do Sol nascente em 21 de junho de 2014. Solstício de inverno.

As estações do ano acontecem em função da inclinação axial da Terra, e do movimento de translação que a Terra executa em torno do Sol. Observando de um mesmo ponto na superfície do planeta, em junho, durante o solstício de inverno veremos o Sol nascer na sua máxima distância ao norte do equador. Em setembro e março, durante os equinócios de primavera ou outono, o Sol nasce no exato ponto cardeal leste, e em dezembro ele atinge seu maior afastamento ao sul do equador.

Se pudéssemos observar de fora da Terra, veríamos que em junho o Sol ilumina o Polo Norte, mas não ilumina o Polo Sul, e em dezembro acontece o contrário.

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Note na imagem acima que em dezembro o Polo Sul é iluminado e o Polo Norte não, e em junho ocorre o contrário. Nos meses de março e setembro ambos os polos são iluminados com a mesma intensidade e pelo mesmo período de tempo. Blog O Guardador de Estrelas.

Vale a pena tentar conhecer o céu das noites de verão, e já que estes são os dias mais longos do ano, viva-os intensamente. Aproveite o dia, e aquele abraço!

O AUTOR:

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Fernando Munaretto é paranaense, radicado na Bahia desde janeiro de 1996. Astrônomo amador, montanhista, amante de história e literatura, trabalha com educação e divulgação da astronomia, ministrando palestras e observações do céu ao ar livre na Chapada Diamantina, no Planetário do Museu Parque do Saber, em Feira de Santana, e com diversas escolas e instituições de ensino da capital, do interior da Bahia e de outros estados.

FONTE: http://www.ibahia.com/a/blogs/estrelas/2014/12/21/feliz-solsticio-para-todos-2/

sexta-feira, 19 de dezembro de 2014

CURTA NA AMAZÔNIA: AS SEDUÇÕES DE UM BOTO



De: Jonathan Amorim

quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

A OUTRA FACE DA ILHA: PONTE DO FURO DAS MARINHAS PEDE CUIDADO

 

Autor: Antônio Amarante Filho

A ponte do Furo das Marinhas, localizada na PA-391, único acesso rodoviário de nossa fantástica e abençoada Ilha do Mosqueiro ao continente tem capacidade para suportar até 24 toneladas, conforme diz uma sinalização totalmente fora do padrão exigido pela legislação pertinente; porém, pela total ausência de manutenção preventiva, essa capacidade deve ter sido reduzida e muito. Como semanalmente várias carretas de 02 e até 03 eixos trafegam pela ponte, carregadas de vários tipos de materiais, o que vai fazer efetivamente a ponte cair, pois uma carreta de 02 eixos carregada tem um peso total de até 39 toneladas, ou seja, extrapola em muito a capacidade da ponte.

Bem verdade que essas carretas vêm abastecer o comércio local; porém, se a ponte for derrubada como foi a de Moju, infelizmente, o mosqueirense vai ficar na pior e sem nenhuma condição de sobrevivência digna, e quem trabalha em Belém vai ficar desempregado. Mas, ao que parece, o que interessa para a gestão pública paraense, é a ocorrência de tragédias, ou será que a SETRAN, o DETRAN e a PRE (japonês) ainda não perceberam essas carretas trafegarem pela ponte?

Isto posto, solicito, com o devido respeito, às nossas autoridades responsáveis pelo tema que adotem as providências legais cabíveis, para impedir que a Ponte do Furo das Marinhas seja, literalmente, derrubada por carretas com peso muito acima do permitido, bem como dote a PA-391 de mais sinalizações informando o peso total permitido, já que só existe uma “quase” sinalização; pois, assim, estarão cumprindo com as suas obrigações de servidores públicos.

FONTE: ESPAÇO DO LEITOR. Diário do Pará – A2. Belém-PA, 18/12/2014

segunda-feira, 15 de dezembro de 2014

EVENTO RELIGIOSO: CÍRIO DE NOSSA SENHORA DO Ó 2014



Realizado, no dia 14 de dezembro de 2014, o Círio de Nossa Senhora do Ó congregou, na Ilha do Mosqueiro, milhares de devotos movidos pela fé.

quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

EVENTO RELIGIOSO: MOTO-ROMARIA DE NOSSA SENHORA DO Ó

 
Foto de Caio Bittencourt
Está Lindaa a nossaa Moto-Romaria... *--*<br />Vale a pena ir à Praça Matriz esperar a chegada!!
Fotos de Gelda Ferreira
Moto romaria. Bênção de Nossa Senhora do O aos motoqueiros e motoristas.

Foto de Gelda Ferreira.

Foto de Gelda Ferreira.

Foto de Gelda Ferreira.

Foto de Gelda Ferreira.

Foto de Gelda Ferreira.

FONTE: Facebook

EVENTO RELIGIOSO: CÍRIO DO MOSQUEIRO 2014

 

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Com uma devoção anterior à fundação da Paróquia do Mosqueiro (1868), Nossa Senhora do Ó é venerada na Ilha desde os tempos da colonização, como ícone do trabalho missionário dos jesuítas e da Irmandade que se tornou o alicerce para a criação da Freguesia.

Neste domingo, 14, acontecerá mais um Círio de Nossa Senhora do Ó, cuja programação foi iniciada no dia 14 de outubro com a Missa do Envio e as Peregrinações em Família. Ontem, ocorreu a homenagem dos Órgãos Públicos do Mosqueiro à Nossa Senhora e, hoje, às 16h, acontecerá a Moto Romaria. Nos dias subsequentes, estão programados;

- 11/12: Caminhada da Fé – saída da Beira do Rio (12h);

- 12/12: Encerramento das Peregrinações (18h);

- 13/12: Missa e Romaria Fluvial - saída de Caruaru (08h);

Romaria dos Ciclistas – saída do Porto do Pelé (10h);

Missa na Igreja Matriz e Trasladação da Imagem (18h);

- 14/12: Missa e Procissão do Círio – saída do Chapéu Virado (07h);

Novena e Santa Missa (19h);

- 15/12 a 20/12: Terço da Aurora (05h30), Novena e Santa Missa (18h30);

- 18/12: Santa Missa e Procissão Luminosa (19h);

- 21/12: Terço da Aurora (06h), Círio das Crianças – saída do Pantanal (7h30), Novena e Missa de Encerramento (18h), Festival de Prêmios (23h).

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                         FOTO: Christopher Bahia

segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

NA ROTA DO TURISMO: AS PRÁTICAS TURÍSTICAS NA ORLA OESTE DE MOSQUEIRO< REGIÃO METROPOLITANA DE BELÉM, PA

 

Willame de Oliveira Ribeiro1, Maria Augusta Freitas Costa 2, Maria Goretti da Costa Tavares3

RESUMO

A Ilha do Mosqueiro pertence ao município de Belém, mas localiza-se a 77 km da sua sede. A Ilha teve seu processo de valorização para o Turismo iniciado no período áureo da economia da borracha e se acelerou com a implantação da ponte ligando-a ao continente, durante a década de 1970. Este artigo objetiva apresentar as práticas turísticas na orla oeste da Ilha de Mosqueiro, identificando o processo de des-re-territorialização de tais práticas e o viés do [eco] turismo como uma possibilidade de nova significação ao uso da orla oeste da ilha.

Palavras-chave: Turismo. Prática turística. Territorialização. Ilha do Mosqueiro. Belém, PA.

ABSTRACT

Tourist Practices in Waterfront West Island Mosqueiro, metropolitan region of Belém, PA, Brazil - The island Mosqueiro belonging to the municipality of Belem and it is located 77 km from the capital. The process for introduction of tourism practice started in the heyday of the rubber economy and it was accelerated during the 1970s with the build of the bridge connecting the island to the mainland. This article presents the tourism practices on the west of the Ilha do Mosqueiro, identifying the its process of de-re- territorialization and the [eco] tourism as a possibility for new meaning to the use of the western edge of the island.

Keywords: Tourism. Tourist Practice. Territorialization. Ilha do Mosqueiro. Belém, PA, Brazil.

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1 Willame de Oliveira Ribeiro - Mestre. Professor e pesquisador da Universidade do Estado do Pará.

2 Maria Augusta Freitas Costa - Mestre. Professora da Universidade Federal do Pará.

3 Maria Goretti da Costa Tavares - Doutora. Professor e pesquisador da Universidade Federal do Pará. E-mail: mariagg29@gmail.com

INTRODUÇÃO

O Turismo, na visão de Knafou (1999), é uma atividade multiforme que evoca a um só tempo uma atividade humana e social atualmente fundamental; no mesmo sentido, De La Torre (1994) é enfático ao tratar das múltiplas interrelações de relevância econômica, cultural e social imersas no Turismo, o qual corresponderia ao deslocamento voluntário e temporário de indivíduos ou grupos, do seu local de residência habitual para outro, fundamentalmente por motivos de recreação, descanso, cultura ou saúde. Sendo assim, o Turismo releva não se reduzir a atividade econômica, como é caracterizado por grande parte da bibliografia sobre tema, conformando-se enquanto uma prática social que, dessa forma, envolve as diversas dimensões da sociedade: cultura, economia, espaço, etc. A sua expansão na Ilha de Mosqueiro (ver mapa a seguir), que dista 77 km da sede do Município de Belém, do qual é distrito desde 1901, deu sequência ao modelo europeu de seus fundadores e acompanhou o desdobramento dos fluxos mundiais de viagens pautados na dobradinha sol e praia. Dessa forma, as 17 praias encontradas na orla ribeirinha da ilha de Mosqueiro, traçada da Ponta do Bitar, na Vila (setor oeste) até a Ponta da Fazenda, na Baía do Sol (setor norte), se formataram como o principal atrativo à demanda turística dos grupos sociais belenenses de maior renda, onde a configuração territorial se delimitava pelas casas de veraneio de segunda residência ao longo das orlas dessas praias (Meira Filho, 1978; Cardoso, 2000; Dantas & Brandão, 2004).

A partir de 1999, com a implementação pela Prefeitura Municipal de Belém (PMB) da tarifa de transporte urbano, que reduziu o preço da passagem à ilha, as práticas turísticas na orla mosqueirense passaram a ser desempenhadas em maior proporção pela população belenense de baixa renda que compõem, juntamente com outros segmentos não necessariamente de baixa renda, os fluxos turísticos excursionistas, isto é, que se deslocam diariamente.

Figura 1: Mapa de localização da Ilha do Mosqueteiro, na Região Metropolitana de Belém, PA

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Fonte: Base Digital da RNB 2001

A maior acessibilidade desse grupo social de menor poder aquisitivo (ampla maioria nesse fluxo excursionista) às praias de Mosqueiro, principalmente àquelas de sua orla oeste (delimitada entre o Porto Pelé na Vila e a Praia do Murubira), propiciou uma maior diversidade social nessa orla ou, no dizer de Baumam (1999), propiciou mais nitidamente o encontro com o ‘outro’. Para Gomes (2002), esse encontro com o outro é essencial à estruturação dos espaços públicos, caso das praias fluviais da ilha de Mosqueiro, entretanto, nesse caso, a ocorrência do encontro é permeada por conflitos de territorialidades entre comerciantes locais, segundos residentes e excursionistas. Nesse trabalho procura-se identificar e analisar os [re]ordenamentos territoriais à orla mosqueirense decorrentes dos conflitos entres essas territorialidades, ou seja, entre as ações estratégicas de estabelecimento, manutenção e reforço do controle sobre outrem, que tornam possível o uso de um dado terreno (Gomes, 2002). A complexidade dessas ações, na interpretação de Souza (1995), ratifica-se na diferenciação entre ‘nós’ e os ‘outros’ e na projeção dessas relações sociais sobre o espaço, podendo, assim, ser abarcada mediante o conceito de território, cuja proximidade com as ideias de controle, domínio e apropriação (políticos e/ou simbólicos) do espaço é marcante.

AS PRÁTICAS TURÍSTICAS E A FLUIDEZ DO TERRITÓRIO NA ORLA OESTE MOSQUEIRENSE

As práticas turísticas na orla das praias mosqueirenses expressam, de acordo com Raffestin (1993) e Souza (1995), o desenvolvimento das relações de uma coletividade que define seus laços com o território através de mediadores ou instrumentos. O peso desses mediadores na produção do espaço turístico de Mosqueiro não reside somente na dimensão material, mas também, em sua dimensão imaterial; no caso da praia, essa possui, segundo Tuan (1980), uma forte conotação simbólica que remete a aceitação e descanso pelos elementos horizontais que a caracterizam, tais como água, areia, vegetação. Esses elementos constituem os primeiros atrativos ao desenvolvimento do turismo de segunda residência na orla oeste mosqueirense e sempre são retomados por esse grupo social como elementos identificadores de sua territorialidade: “é esse lugar ímpar, bucólico, a beleza das praias [...]” (turista de segunda residência, jan. de 2005).

Os mosqueirenses também remetem a esses atrativos para delimitar a sua territorialidade nas praias da orla oeste da ilha, incisivamente os poderes, econômico e elitista, locais: comerciantes do ramo de material de construção, de hotelaria, de alimentação e entretenimento, de abastecimento de combustível e profissionais liberais ligados ao Turismo etc. (Daniel, 1988; Ribeiro, Costa, Gomes & Tavares, 2004). Segundo um representante desses poderes: “As pessoas que vem deixar mercadorias aqui, de Santa Catarina, Paraná acham linda as praias de água doce com ondas [...] a beleza natural já nos foi dada [...]”.

Juntas, essas duas territorialidades - turistas de segunda residência e comerciantes e elite local - detinham o controle do uso da orla oeste até aproximadamente a última década do século passado. Foram essas territorialidades as responsáveis pela implementação das obras de infraestruturas necessárias ao uso turístico, como construção de trapiches, urbanização das orlas das praias, instalação da rede de telefonia e de energia elétrica, seja de forma direta ou indireta, pressionando o governo estadual e municipal, a exemplo da construção da ponte Sebastião de Oliveira, que interligou a ilha ao continente, obra que teve incisiva intervenção dos turistas de segunda residência como Augusto Meira Filho, que projetou a ponte e organizou uma construtora para efetuar “a obra do século que vai dotar a Ilha balneária do progresso que a tanto tempo desejava e merecia” (Amanajás, 1976, p. 11).

Como substrato da fluidez territorial proveniente da construção da ponte Sebastião de Oliveira, os fluxos excursionistas da população de baixa renda da sede municipal passaram a se dirigir com maior frequência à ilha. Esses fluxos já se faziam presentes em Mosqueiro desde a inauguração da rodovia Augusto Meira Filho, no final da década 1960, mas é a partir da construção da ponte, inaugurada no final da década de 1970, que esses fluxos ganham notoriedade, pois não mais se restringiam ao uso da praia de São Francisco localizada no norte da ilha e até então menos valorizada pelos segundos residentes. Esses passam a se dirigir às praias do eixo oeste, principalmente as praias do Farol e do Chapéu Virado. De acordo com um ex-agente administrativo de Mosqueiro4, na segunda metade da década de 1990 a flutuação populacional nos finais de semana de julho - alta estação do veraneio paraense - chegava a 150 mil pessoas.

Essa flutuação, em sua maioria formada por grupos excursionistas, era atraída a Mosqueiro pelo prazer e descanso que o ideal da praia simboliza à sociedade contemporânea (como ressalta Tuan (1980), a “areia cede à pressão, penetrando entre os dedos do pé e a água recebe e ampara o corpo” (p.131)), mas também e essencialmente pelos eventos musicais promovidos por emissoras de rádio locais, que instalam palcos par shows na orla das praias do Farol, Chapéu Virado e Murubira; e pela realização das Micaretas baianas5. Esses fluxos excursionistas foram durante longo tempo bem aceitos pelos grupos sociais que vivem da renda gerada pelo Turismo e por parte dos turistas de segunda residência, contudo, quando tais fluxos passaram a ser compostos de forma mais intensa por excursionistas de baixa renda, esses grupos sociais reivindicam o controle dos eventos musicais na orla oeste.

Nesse ínterim, comerciantes locais e turistas de segunda residência retomaram o discurso da ‘ilha bucólica’ e organizaram campanhas publicitárias de desestímulo à prática das Micaretas em Mosqueiro, o que provocou uma reação da Prefeitura Municipal de Belém, que passou a interferir na organização desses eventos ao constatar uma sobrecarga dos trios elétricos que pressionavam as encostas das praias do Porto Arthur e do Murubira. A diminuição da realização desse tipo de evento em Mosqueiro reflete bem a intencionalidade da ação: o controle de um grupo sobre um dado espaço para delimitar seu uso, no caso, tentando ou/e excluindo os fluxos de baixa renda. A evidência de tal intencionalidade fica clara na declaração de um comerciante e corretor da Ilha: “Eu adoro aquele barato mas hoje eu não quero desse jeito, só se fosse com outra música, essa atrai gente que não presta [...]” (Comerciante local, jun. 2004).

Todavia, esse controle foi abalado no final da década de 1990 com a introdução pela Prefeitura Municipal de Belém de vários ônibus com tarifa urbana, ou seja, tarifas iguais às praticadas na sede do Município, no percurso Belém-Mosqueiro, cujos aproximadamente 77 Km encontram-se distribuídos entre os municípios de Ananindeua, Marituba, Benevides e Santa Bárbara e, portanto, até então, caracterizavam a viagem e o preço da passagem para Mosqueiro como intermunicipal. Criada para atender a uma reinvindicação dos moradores de Mosqueiro que trabalhavam e estudavam na sede municipal, essa política intensificou novamente os fluxos excursionistas de baixa renda na orla das praias do setor oeste dessa localidade, em maior proporção que em momentos anteriores, segundo dados dos órgãos que organizam o veraneio na Ilha (Polícia Militar, Corpo de Bombeiros e Secretaria de Transporte). Em julho de 2003, em média, 300 mil pessoas frequentaram as praias da ilha nos finais de semana, se concentrando na orla oeste.

4. Entrevista em nov. 2003, pelos autores.

5. Carnaval fora de época com influência musical do axé baiano.

UM OLHAR SOBRE O ‘OUTRO’: A DES-RE-TERRITORIALIZAÇÃO DAS PRÁTICAS TURÍSTICAS NA ORLA OESTE

[...] chega domingo de manhã / fica difícil passar, sem um banho de mar / tem a distância, a lotação, tumulto e / então [...] zoando na areia / quando chega na água / vou me acabar / quando chegar na água jacaré é o que / vai dar porque / tem limão, tem mate, melancia fatiada [...] (Falcão; Xandão; o rappa; 1996).

A concentração desses fluxos nas praias da orla oeste engendrou, como indica Souza (1997), a desordem do ambiente turístico preexistente e o estabelecimento de uma nova ordem. O ordenamento territorial imposto pela prática turística de segunda residência na orla oeste de Mosqueiro perpassava pela normatização desse espaço, como pode ser constatado no art. 152 do Plano Diretor Urbano de Belém (PDU): “a ordenação dos espaços da ilha de Mosqueiro [... destina-se a] recreação e lazer [...] da população belenense de média renda” (PMB, 1994). Mas a partir da implementação da tarifa urbana ocorre uma ruptura na diretriz do ordenamento territorial do turismo na orla de Mosqueiro, criando uma lacuna que fora apropriada pelos moradores menos abastados da sede municipal, que passaram a usar com expressiva intensidade as praias da orla oeste da Ilha.

Esse uso se deu em tal magnitude que ao observar o movimento do fluxo turístico na orla das praias do Farol, Chapéu Virado e Murubira; durante os finais de semanas de julho, por exemplo, constata-se que o controle territorial dessa orla é exercido por grupos sociais que para lá se dirigem numa mobilidade diária. Isso induz a pensar como Souza (1995), em um território móvel, em outras palavras, que se estabelece no próprio movimento excursionista, pois, na perspectiva desse autor, um território móvel não requer necessariamente um enraizamento profundo no lugar, ele pode ser instável e periódico, ser formado e dissolvido rapidamente, o que é bem propício ao entendimento da territorialidade dos excursionistas na orla oeste de Mosqueiro.

Na visão de Haesbaert (2004) esse tipo de território tem por característica ser mais flexível, admitindo ora a sobreposição (e/ou multifuncionalidade) territorial, ora a intercalação de territórios. Essa sobreposição é visualizada na orla oeste, posto que a territorialidade do segundo residente coexiste com a dos excursionistas, fundamentalmente na praia do Murubira, que ao longo de sua configuração histórico-territorial formatou-se como uma orla mais elitizada e onde se encontra boa parte dos objetos espaciais componentes do atrativo turístico dos excursionistas: palcos para eventos musicais e as aparelhagens eletrônicas, que segundo os turistas de segunda residência e os comerciantes locais são responsáveis por trazer a “rataria” (termo usado por um entrevistado para designar os grupos sociais advindos do excursionismo) a Mosqueiro. Como lamenta um entrevistado: “Tiraram o trio elétrico mas aparelharam toda a orla do Murubira” (Segundo residente, jan. 2005). Entretanto, o que se observa não só nos finais de semanas de julho, mas também no Carnaval e nos finais de semanas de feriados prolongados, “é a presença de um processo de domínio e/ou apropriação que dota o espaço de função e expressividade” (Haesbaert, 2004, p.243) por parte dos grupos sociais excursionistas.

De acordo com Gomes (2002), a frequência de determinados grupos sociais em trechos de praias ou em praias específicas, expressa a identificação desses grupos com objetos territoriais ou horários resolutos. Nesse sentido, o lamento do turista de segunda residência sobre as aparelhagens eletrônicas na orla da praia do Murubira remete ao fato desse saber que os excursionistas se identificam com tais objetos espaciais, como afirma um excursionista ao ser indagado se não se incomodava com a intensidade alta das aparelhagens, a diversidade de gêneros musicais que ecoava naquele instante: “A gente quer é curtição, quanto mais festa melhor, quanto mais gente melhor” (jul. de 2004). O relato do frequentador das praias da orla oeste mosqueirense, quando comparado ao do segundo residente inscrito anteriormente, remonta a análise de Urry (1996) acerca da prática social do Turismo: “Não existe um único olhar do turista enquanto tal. Ele varia de acordo com a sociedade, o grupo social e o período histórico. Tais olhares são construídos por meio da diferença. Com isso quero dizer que não existe apenas uma experiência universal verdadeira para todos os turistas, em todas as épocas [...]” (p.16).

Na visão de Urry (1996), alguns grupos sociais definem-se enquanto turista por meio do ‘olhar coletivo’, olhar que percebe os lugares mais adensados não como uma limitação das práticas turísticas, mas como uma motivação, um signo, um lugar de devaneios e fantasias. Nesse sentido se organizam os movimentos de excursionistas à Ilha de Mosqueiro - “quanto mais gente melhor” - e, sob essa perspectiva, impõem sua territorialidade às praias da orla oeste dessa Ilha, propiciando uma dinâmica muito peculiar que perpassa por viajar para um lugar para realizar atividades fora do seu espaço cotidiano, transportando parte de seu cotidiano, como se observa na fala de um entrevistado: “A gente traz de casa a farofa, o frango assado, às vezes compra carvão e assa aqui mesmo na praia [...] todo mundo viaja e se diverte, traz até um sonzinho [...]”. Mas transportar o cotidiano não os libera de serem turistas dado o aparecimento das variáveis lazer e viagem dissociada de atividades de trabalho.

Nesse ínterim, se constata no ‘trazer de casa’ estratégias de uso dos espaços da cidade dos homens ‘lentos’ de Belém, os que, segundo Santos (1999), detém a força e que, no caso de Mosqueiro, se apropriaram de uma descontinuidade nas políticas que subsidiavam o controle territorial da orla oeste dessa localidade pelos turistas de segunda residência. A criação da tarifa urbana pode ser considerada o marco dessa descontinuidade que propiciou aos pobres da cidade de Belém a possibilidade de mais fortemente imporem suas formas de uso as praias de Mosqueiro, abrindo um debate ruidoso sobre o uso turístico dessas praias, isso porque como relata Santos (19990: “Por serem ‘diferentes’, os pobres abrem um debate novo, inédito, às vezes silencioso, às vezes ruidoso, com as populações e as coisas já presentes [...] encontrando novos usos e finalidades para objetos e técnicas e também novas articulações práticas e novas normas, na vida social e afetiva [...]” (p. 261).

Mas relembrando a assertiva de Urry (1996) exposta em parágrafo anterior, o Turismo não é uma prática de um olhar exclusivo e, portanto, o que aparece sob ‘olhar coletivo’ dos excursionistas como a ordenação de um tipo de uso na orla oeste mosqueirense, para os turistas de segunda residência é a expressão da desordem e do caos social. O que aparece nas falas dos representantes desse fluxo turístico é o princípio de ordem traçado pelo ideal de pureza onde, como constata Bauman (1998), há ‘lugares certos’ para cada uma das coisas. Foi sob essa égide que esse fluxo articulado aos comerciantes locais, que estabeleceram no PDU do município de Belém de 1994, que as praias da ilha de Mosqueiro eram destinadas ao uso turístico da ‘classe média’, ao passo que as ‘classes menos favorecidas’ deveriam frequentar as praias de outra ilha do município, cuja funcionalidade seria específica para esse fim. Parece ser sob essa mesma égide que os turistas de segunda residência, saudosistas, relembram o passado quando “o preço da passagem era um, as praias eram limpas” (jul. de 2004). Como aponta Bauman, a limpeza sempre aparece nos discursos associada ao sentido de ordem, enquanto que o seu oposto, a sujeira, estaria relacionada à desordem. Na relação de uso das praias de Mosqueiro, a desordem é associada aos fluxos excursionista; estes são a própria ‘sujeira’, o que remete a designação de ‘rataria’ usada por um outro entrevistado.

Partindo desse pressuposto, na busca do ideal de pureza, ou seja, de estar entre iguais, os turistas de segunda residência que detinham o controle da orla oeste, quando da inserção mais intensa dos movimentos excursionistas nessa área sofreram um processo de des-re-territorialização (Haesbaert, 2004) ainda em curso. Nesse processo aparecem dois sentidos mais nítidos: a desterritorialização total e reterritorialização em outros destinos turísticos e a desterritorialização parcial e reterritorialização momentânea em outras partes da Ilha. No primeiro sentido, o processo constitui-se mais simples, pois os turistas acabam por colocar à venda seus imóveis e se direcionar, principalmente, às praias do município paraense de Salinopólis ou às praias de Fortaleza, no estado do Ceará. De acordo com um corretor de imóveis que atua em Mosqueiro, 70% dos proprietários cuja venda de seus imóveis estava sobre sua responsabilidade entre 2000 e 2004, tinham uma dessas duas localidades como destino turístico, fato ratificado na fala de Lima (2000): “A Bucólica há muito tempo já deixou de ser o reduto de uma minoria privilegiada, porque quem tem realmente dinheiro, passa os feriados em Salinas, no Nordeste, ou no Sul Maravilha” (p. 4).

Já no segundo sentido, o processo configura-se com um grau de complexidade maior, dentro do qual vislumbram-se três estratégias de reterritorialização, todas com a manutenção das casas de veraneio na orla oeste: a primeira perpassa pelo uso das praias dessa orla pelos turistas de segunda residência somente durante o período de baixa estação, assim, ou as casas permanecem fechadas durante o mês de julho e os grandes feriados como Carnaval e Semana Santa, ou são alugadas. Em 2003 constatou-se na orla das praias Grande, Farol e Chapéu Virado que 15% das residências de veraneio estavam fechadas no período do Carnaval e 10% no mês de julho; trata-se de propriedades bem cuidadas e cujos caseiros relataram serem usadas pelos proprietários durante os finais de semanas dos outros meses do ano. A segunda estratégia vincula-se ao deslocamento dos segundos residentes das praias da orla oeste durante os finais de semanas em que o uso dessa orla é efetivado pelos fluxos excursionistas para praias mais afastadas, como as do Paraíso e do Maraú, no norte da Ilha, onde “ainda tem muita natureza” e “a gente pode lembrar da bucólica” (segundo residente, fev. 2003). Na concepção de Knafou (1999), a necessidade de recorrer a espaços com ‘muita natureza’ ou que sejam ‘bucólicos’ reflete uma prática turística que se traduz pelas ‘heranças elitistas’ que ensejam uma forma de controle sobre o uso de determinadas localidades turísticas.

Para Urry (1996), as heranças elitistas compõem-se por um olhar ‘romântico’ cuja solidão e privacidade são enfatizadas na prática turística, num relacionamento quase totalmente espiritualista com o objeto do olhar que muitas vezes se direciona a aspectos da paisagem natural. Nesse sentido, quando um turista de segunda residência declara: “Agora eles colocam esses palcos imensos, cartazes gigantescos, até um shopping! [...] a gente nem consegue ver a beleza das praias, a natureza [...]” (agosto, 2004), ele indica seu imaginário acerca do uso das praias, imaginário que é socialmente produzido e, como aponta Castro (1997), com forte conteúdo espacial seja natural ou construído. Na perspectiva dessa autora, entender a geografia contida no imaginário social possibilita vislumbrar-se as representações espaciais daí decorrentes e como essas induzem a determinadas práticas e organizações espaciais. Na Ilha de Mosqueiro, portanto, a prática dos segundos residentes de se direcionarem a praias que “ainda tem muita natureza” emerge da representação espacial desse grupo social, ou seja, de seu olhar sobre as praias da orla oeste de Mosqueiro.

Segundo Tuan (1980), apesar de ser limitado à aparência e essencialmente estético, esse olhar, bem como o olhar dos excursionistas, é relevante por trazer perspectivas novas e, assim, abrir constantes debates sobre certas realidades. No caso dos segundos residentes essa relação aparece intrínseca as experiências de topofilia, de que trata esse autor. Em outras palavras, para uma parcela significativa dos entrevistados desse grupo social (45%), o espaço da orla oeste de Mosqueiro revela-se como um lugar repleto de sentimentos e emoções, como se observa na fala de um desses entrevistados: “Eu construí essa casa, eu mesmo, que era pra mim e minha mulher vir mais [...] agora nem a gente nem meus filhos vêm, só um é que se interessa. É uma pena, aqui é tão bonito, eu vivi tantos momentos” (julho, 2004).

A terceira estratégia se caracteriza por um processo de relativa enclausura, marcado pela elevação dos muros das casas de veraneio. Nessa estratégia os turistas de segunda residência, durante os finais de semana, não fazem uso das praias e se recolhem ao espaço físico de suas propriedades que, em geral, possuem piscinas e áreas para prática de esporte. Essas três estratégias dos turistas de segunda residência permitem entender a configuração de territorialidades móveis nas praias da orla oeste mosqueirense, estabelecidas e desfeitas fugazmente como propõe Souza (1995) acerca dos territórios substratos da mobilidade. Assim, a configuração territorial nas praias da orla oeste da ilha, incisivamente em alta estação, constitui-se predominantemente por uma intercalação entre a territorialidade dos segundos residentes e dos excursionistas de baixa renda, os primeiros controlando o uso dessas praias nos finais de semanas e, os segundos controlando esse uso nos dias úteis da semana. Portanto, essas territorialidades são concebidas no próprio movimento, a partir da “repetição do movimento, entendida a repetição como uma espécie de movimento ‘sob controle’”. (Haesbaert, 2004, p. 243)

A RIGIDEZ DO PODER ECONÔMICO E DA ELITE MOSQUEIRENSE: QUANDO A IDÉIA DA DIFERENÇA NÃO FUNDA UM ESPAÇO

O movimento ‘sob controle’ que excursionistas e segundos residentes exercem na orla oeste de Mosqueiro engendra, na concepção de Knafou (1999), a delimitação do território turístico e, só a partir dessas práticas, se pode falar em território do Turismo. Assim, nessa concepção, a invenção e a produção pelo Turismo de um território vinculam-se ao uso de determinados espaços por grupos de turistas, que são “mais ou menos retomados pelos operadores turísticos e pelos planejadores” (Idem, p.73). Na ilha de Mosqueiro, como se relatou anteriormente, a operacionalização e o planejamento foram sempre retomados das práticas turísticas dos segundos residentes, o que implica dizer que a des-re-territorialização dessas práticas incidiu sobre a territorialidade de donos de hotéis, de bares e restaurantes, de postos de gasolina, de lojas de materiais de construção etc. Partindo-se da análise de Daniel (1988), essas territorialidades constituem o poder econômico e o poder social da elite em Mosqueiro e cujo controle comercial da orla oeste mosqueirense foi abalado proporcionalmente ao aumento dos fluxos excursionistas à ilha.

Esse abalo derivou, entre outros fatores, da penetração de comerciantes ambulantes nessa orla que, percebendo a mudança nas práticas turísticas nessa localidade e beneficiados pela facilitação da acessibilidade promovida pela introdução da tarifa urbana, passaram a disputar o consumo dos turistas com os proprietários de barracas, restaurantes e lanchonetes estabelecidos na orla fluvial de Mosqueiro. Essa disputa provocou o repasse desses estabelecimentos a outros proprietários e acirrou os conflitos entre comerciantes locais, ambulantes e excursionistas como demonstra a fala de um comerciante local: “O ambulante é despreparado, sujo e violento [...]quando vão embora levam todo o dinheiro, e o que fica para Mosqueiro? [...] e esse pessoal que vem pra cá só com o dinheiro da passagem” (agosto, 2004). Esta assertiva, no entanto, é questionada por ex-agente distrital de Mosqueiro, segundo o qual desde que os fluxos excursionistas passaram a frequentar com mais intensidade às praias da Ilha, ocorreu um incremento na economia de aproximadamente 40%.

Na perspectiva de alguns entrevistados a predominância do comércio ambulante na orla oeste de Mosqueiro é substrato dos preços praticados pelos comerciantes locais que, de acordo com eles, exploram os turistas: “[...] um prato que custa 10 reais é alterado para 100 reais, dependendo da cara do freguês” (Segundo residente, jan.2005). Mas para os prestadores de serviços instalados nessa orla, o grande problema do turismo na ilha é a tarifa urbana, responsável segundo os donos de hotéis por “uma queda brusca no número de hospedagem”. Nesse ínterim, esses prestadores de serviços, tentando restabelecer a ordem turística anterior, passaram a fomentar uma campanha pela revisão da lei que instituiu a tarifa de transporte urbano entre a sede municipal e a Ilha. Essa campanha era apenas parte da estratégia de ordenamento dessa territorialidade para a orla oeste de Mosqueiro, que perpassava pela criação e fortalecimento de associações, como a Pró-Turismo, composta por prestadores de serviços e turistas de segunda residência, cuja principal ação depois de sua criação em julho de 2003. Foi a organização da festa de encerramento desse mesmo ano na praia do Farol que, segundo um membro da diretoria “no ‘ano novo’ não houve uma ocorrência [...] só tocamos marchinhas de Carnaval, eu acho que é isso – organização [...] onde não tem sujeira rato não vem”.

Na fala desse morador fica explicitado o sentido da organização turística proposta por essa associação, uma organização em que o uso das praias da orla oeste seja destinado a pessoas que gostem de um tipo específico de música e que não gostem de sujeira, características que na visão desse grupo social não pertencem aos excursionistas de baixa renda. Todas as ações das associações que atuam na orla oeste de Mosqueiro têm o objetivo claro de desterritorializar esses excursionistas nessa orla, todavia a estratégia mais audaciosa e que poderia tornar a territorialidade dos prestadores de serviço livre para controlar o uso da orla oeste, sem dúvida rebatia sobre a tentativa de criação do Município de Mosqueiro. A liberdade, de acordo com Bauman (1998), consiste no poder de agir de acordo com vontade própria para alcançar resultados propostos, dessa forma, o projeto de lei do deputado estadual César Colares, que pretendia instituir o município de Mosqueiro, transformou-se em vetor de liberdade para os comerciantes dessa área instaurarem sua visão de ordem no uso turístico dessa localidade.

A proposta de criação do Município de Mosqueiro, no final da década de 1990, surge dentro do contexto eleitoral desse período sendo amplamente defendida pelo poder econômico e social da elite mosqueirense, apesar do autor da proposta, o deputado César Colares, não ser filho da terra. O posicionamento desses poderes frente a essa proposta difere de seus posicionamentos durante a proposta similar realizada pelo então deputado estadual Nicias Ribeiro no início dessa mesma década, quando esses poderes organizaram campanhas publicitárias em favor da não emancipação no plebiscito de 1991, do qual saíram vencedores. Ao ser indagado sobre o assunto, um representante desses poderes assim descreve sua atitude frente às propostas de emancipação: “[...] o preço da passagem era um, as praias eram limpas, no momento [...] não errei. Nós só não esperávamos que o Município de Belém fosse brigar com o Estado [...] eu e vários empresários de Mosqueiro fomos buscar o César Colares” (representante do ramo hoteleiro, jun. 2005). Na primeira parte da fala, o representante discorre sobre seu posicionamento contrário a primeira proposta de emancipação, e já demonstra porque era adepto da segunda proposta: “o preço da passagem é outro, as praias estão sujas”.

Nessa segunda proposta o Turismo é enfatizado como a principal base econômica de sustentabilidade financeira para o novo município e teve como principal fonte fomentadora a então Política Nacional de Municipalização do Turismo (PNMT), do Governo Federal. Essa política, no entanto, segundo gestores públicos, existiria desde 1995 e nunca conseguira se consolidar e, além disso, os recursos eram repassados aos governos estaduais que os redirecionavam aos governos municipais, não sendo assim, canalizados diretamente aos prefeitos, o que demandaria muita articulação para realmente adquiri-los. Segundo ex-secretários municipais do governo do PT em Belém, além dos contratempos para usufruir os recursos do PNMT, o distrito de Mosqueiro, se emancipado, não teria renda própria, pois os índices de arrecadação nessa localidade são baixos e, assim, o pretenso município ficaria dependente dos repasses federais do Fundo de Participação dos Municípios, que como mostra o Gráfico 1, representaria quase a metade dos recursos repassados pela PMB em 2004.

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GRÁFICO 1 - Recursos que seriam destinados pelo FPM a Mosqueiro em caso de emancipação e os repasses efetivados pela PMB em 2004.

Como se constata no Gráfico 1, os recursos do FPM que são repassados para municípios com população de 28 mil habitantes (população oficial de Mosqueiro segundo censo de 2000) seriam muito inferior aos R$ 3.004.749 investidos pela PMB em 2004 (PMB, 2004). Considerando-se que 42% desses recursos são empregados em atividades vinculadas as práticas turísticas em Mosqueiro, como eventos culturais e infraestrutura urbanística, a exemplo da reestruturação da orla das praias do Farol e Chapéu Virado realizada entre os anos de 2003 e 2004. Some-se a esses dados o fato de que nos meses de fevereiro e julho a PMB investe cerca de 150 mil para preparar a ilha para receber os turistas para o carnaval e o veraneio respectivamente (PMB, 2004). Nesse viés, a emancipação político-administrativa de Mosqueiro não seria responsável pelo fortalecimento das práticas turísticas na orla oeste mosqueirense, já que os recursos destinados pelos gestores municipais aos empreendimentos turísticos nessa orla tenderiam a ser reduzidos. Mais do que isso, o uso dessa área seria controlado pelos opositores dos fluxos excursionistas que estavam à frente da proposta de emancipação, isso significa dizer que o espaço da diferença que se arraigou nessa orla com o aumento desse fluxo nessa área seria induzido à homogeneização do uso turístico dos segundos residentes.

NO VIÉS DO [ECO]TURISMO: UMA NOVA SIGNIFICAÇÃO AO USO DA ORLA OESTE

No bojo desses conflitos na orla oeste de Mosqueiro com o objetivo de estimular o uso turístico da orla oeste pelos fluxos turísticos mais abastados da sede municipal de Belém o governo municipal petista (1998-2004) implementou, além de obras urbanísticas, a revitalização da trilha ecológica Olhos D’Água, no extremo oeste da ilha. Os aspectos socioambientais de Mosqueiro negligenciados até a década de 1990 pelos planejadores do Turismo nessa localidade, cuja preocupação primordial era com a implantação das infraestruturas emergenciais (operação tapa buraco, por exemplo), com a revitalização dessa orla tornam-se centrais para esses planejadores, sendo a partir dessa revitalização demarcada a ingerência direta da Companhia de Turismo de Belém (Belemtur). O primeiro processo de revitalização implementado pela Belemtur deu-se em 1998, quando a trilha ainda era denominada como I Trilha Ecológica de Mosqueiro. Durante essa revitalização estabeleceu-se uma intercalação do percurso terrestre com um percurso fluvial, cujo ponto de partida passava a delimitar-se no trapiche da Vila de Mosqueiro na orla da praia do Areião e o término no porto Pelé, no bairro do Maracajá.

Para Fenell (2002), o crescimento do fluxo do turismo ecológico é resultado dos debates mundiais acerca da conservação do meio ambiente e resulta diretamente das concepções de desenvolvimento sustentável sendo, portanto, na visão desse autor, uma forma de turismo em que o visitante aprecia a história natural de uma área e suas culturas, contribuindo para a conservação dessa área e para o bem estar da população local. Nesse viés, a implementação da trilha Olhos D’Água incidiu sobre a forma de organização sócio espacial dos grupos de nativos mosqueirenses, que vivem a aproximadamente um século em três localidades no extremo oeste da ilha: Caruaru, Castanhal do Mari-Mari e Espírito Santo, pois é em áreas como as dessas localidades, cuja exuberância dos recursos naturais e dos traços tradicionais denotam características de ‘paisagens notáveis’ (Rodrigues, 1997) que, segundo a definição de Fenell (2002), os eventos do ecoturismo se instalam.

Dessa forma, um antigo caminho de 3.886m de extensão, usado pelos nativos para interligar duas dessas comunidades, transforma-se em atrativo turístico, cujas características socioambientais como espécies florísticas como a Andiroba, a Seringa e o Guarumã, e as lendas, a pesca artesanal de camarão, a extração do Açaí e o fabrico da farinha de mandioca, proporcionariam “experiência individual direta com o ambiente de paisagem rústica e com o nativo” (Leony, 1997, p. 54). Para o mesmo autor, a redescoberta das singularidades mediadas pelo meio e proposta, pelos novos estilos do Turismo, mais personalizados e diferenciados, induz a valorização crescente de destinos como os da trilha Olhos D’água, que se constituem como um diferencial em relação a outros eventos ecoturísticos na cidade de Belém. Diferem, essencialmente, por inserir traços da sociabilidade local numa valorização das experiências dos nativos mosqueirenses e por estimular o resgate de práticas já não realizadas por esse grupo social, gerando a criação de um grupo de Carimbó (dança típica de algumas áreas paraenses) e da produção de artesanatos. A noção de sociabilidade, na perspectiva de Santos (1999), afirma-se na densidade social provocada pelo intercâmbio efetivo entre as pessoas.

Segundo Lópes (2001) a base não-mercadológica dos movimentos turísticos revela-se na demonstração de orgulho dos moradores das áreas receptoras, ou seja, dos sentimentos, significados e privilégios que esses identificam a sua pertença ao lugar e a pertença desse ao mundo. No circuito do turismo ecológico de Mosqueiro isso se evidencia nos relatos de cerca de 80% dos 26 chefes de famílias entrevistados: “Gosto de contar a estória, é importante” (Morador do Castanhal do Mari-Mari, dez. 2003); “[...] foi bom porque temos novos conhecimentos, ver estrangeiro [...] ele divulga mais a comunidade, a gente fica mais conhecido” (Moradora do Caruaru, dez. 2003). Para Bauman (2001), o encontro com o ‘outro’, com o ‘estranho’, peculiar aos movimentos turísticos, tem como único ponto de apoio o “fio fino e solto de sua aparência, palavras e gestos” (p. 111). Mas, na concepção de Lópes (2001), esse fio fino e solto pode se metamorfosear em uma densa relação pela reciprocidade entre visitantes e visitados. Observa-se nas localidades envolvidas pela trilha Olhos D’água que essa metamorfose encontrava-se em curso no ano de 2003 com a presença de turistas se alojando nas propriedades dos nativos com relativa frequência o que engendrava relações de amizade entre esses grupos sociais.

Entretanto, a definição do projeto da trilha ecológica Olhos D’água como substrato das mudanças territoriais na orla oeste mosqueirense resultou, também, no aumento das tensões sociais locais na área do projeto. Verifica-se o aumento dessas tensões através dos impactos sobre os espaços de mata ao longo da trilha, que constantemente são queimados por moradores contrários a trilha, incisivamente por não participarem diretamente dos eventos dessa, ou seja, não terem uma renda proveniente dessa. Isso porque apenas 10% dos moradores das localidades abarcadas pela trilha desenvolvem uma relação direta com os eventos por ela promovidos como guia turístico, contador de estórias e apresentação do fabrico da farinha, sendo que em média esses moradores recebiam R$ 10,00 por grupo de turistas que visitam a trilha. Nesse ínterim, a realização do projeto da trilha pouco apresenta relação com a concepção teórica do ecoturismo mencionada anteriormente por Fenell (2001), mas repercutiu o objetivo inicial de atrair novamente os fluxos turísticos mais abastados da sede municipal de Belém, como demonstra o Gráfico 2.

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Gráfico 2 - Origem dos visitantes da trilha Olhos D’Água de acordo com os moradores locais em 2004. 70%18%44%.  Fonte: Trabalho de campo realizado em Mosqueiro em janeiro de 2004.

Como demonstra o Gráfico 2, 70% dos turistas que visitam a trilha são paraenses, sendo que cerca de 80% são belenenses com relativo poder aquisitivo, já que para visitar a trilha uma pessoa gastava em média R$50,00. Nesse mesmo Gráfico é possível observar que, de acordo com a percepção dos moradores do entorno da trilha, 44% das visitas a essa localidade é efetuada por estrangeiros, os europeus representando a maior parcela, fato que demonstra como os discursos ambientalistas das décadas de 1970 e 1980, principalmente sobre a Amazônia, foram entronizados nesse continente, como relata um comerciante estabelecido no trajeto da trilha: “O turismo aqui ainda vai crescer muito [...] os alemães querem vir dormir aqui [...] eles vem pra ver a Amazônia, mas tem pouco tempo pra ficar em Belém e pela proximidade e exuberância esse é o lugar [...]” (agosto, 2003). A prática ecoturística no oeste da ilha de Mosqueiro corresponde, na grande maioria, a fluxos turísticos excursionistas, pois os frequentadores da trilha passam apenas algumas horas nessa área, mas a ingerência de políticas no sentido de propiciar o aumento desse fluxo nunca foi questionada.

Nesse sentido, a reforma do porto Pelé na orla do rio Murubira que modificou um espaço que até então nunca tinha recebido investimentos governamentais e era mantido por um grupo de pescadores locais, não recebeu nenhuma crítica de outras territorialidades turísticas em Mosqueiro. Essa obra apesar de ter melhorado estruturalmente o porto Pelé e, portanto, as condições de vida e de trabalho dos moradores dessa porção territorial de Mosqueiro que se utilizam do transporte fluvial para escoarem a produção, levarem os filhos ao médico e à escola, propiciou uma maior circulação de turistas nessa área, o que provocou um aumento no número de embarcações atracadas nesse porto à espera dos visitantes para atravessar para uma das três novas trilhas ecológicas abertas depois da trilha Olhos D’água em áreas próxima a mesma, isso vem provocando uma espécie de congestionamento no porto que dificulta a circulação da população local e dos produtos que essas comercializam a mais de um século por essa via.

A ORLA OESTE ENQUANTO ESPAÇO PÚBLICO: O QUE PODE O ENCONTRO ENTRE ESTRANHOS (A GUISA DE CONCLUSÃO)

A dinâmica de relações de poder estabelecida na orla oeste da Ilha de Mosqueiro por meio da busca de domínio e controle desse espaço, conformada na constituição de territórios por parte das próprias práticas turísticas, como é o caso dos excursionistas e dos segundos residentes, e por agentes diretamente ligados ao turismo, como comerciantes e outros prestadores de serviços; cria a necessidade de uma reflexão mais atenta acerca da funcionalidade dessa orla enquanto espaço público. As restrições ao usufruto do espaço apresentam-se marcadamente contraditórias se a este for atribuída a qualidade de público, pois, “fisicamente, o espaço público é, antes de mais nada, o lugar, praça, rua, shopping, praia, qualquer tipo de espaço, onde não haja obstáculos a possibilidade de acesso e participação de qualquer tipo de pessoa” (Gomes, 2002, p.162). A dimensão física demonstra, nesse caso, sua relevância a compreensão da realidade social, uma vez que, em grande medida, os elementos mobilizados à construção dos territórios na referida orla vinculam-se aos trunfos espaciais (Souza, 1995) nela encontrados, tanto os inerentes ao espaço físico como: a areia da praia, a vegetação; quanto os socialmente produzidos como: arenas de esportes, palcos de shows, calçadas, casas de veraneio, constituindo-se, assim, bases fundamentais aos discursos do ‘bucólico’ e do ‘fazer parte de uma multidão’, o primeiro mais diretamente ligado aos turistas de segunda residência e a elite e poder econômico locais a eles associados; e o segundo mais identificado aos excursionistas.

A orla oeste da Ilha de Mosqueiro possui no conflito entre essas territorialidades uma de suas marcas mais fundamentais, muitas vezes se manifestando em tentativas de restrição do acesso a determinados grupos, o que pode ser constatado nas estratégias da elite e poder econômico locais e segundos residentes com vistas à restrição do fluxo excursionista à ilha. O esforço para afastar o outro, o diferente, evitando, desse modo, a necessidade de comunicação, de negociação, de compromisso mútuo, se apresenta coerentemente com a preocupação contemporânea obsessiva com a poluição e a purificação, com a “tendência de identificar o perigo para a segurança corporal com a invasão de ‘corpos estranhos’ e de identificar a segurança não ameaçada com a pureza” (Bauman, 2001, p.126). Neste sentido, torna-se comum a recorrência no discurso do ‘bucólico’ à analogia entre os fluxos excursionistas e a violência e a sujeira, como demonstrado anteriormente.

O ‘fazer parte da multidão’ nem sempre se apresentou antagônico ao ‘bucólico’, sendo, desse modo, aceito e incentivado pela elite, poder econômico local e turistas de segunda residência, com isso, torna-se evidente que a preocupação desses agentes não está voltada para o turismo de massa em si, mas para a composição desse, ou seja, o conflito somente ganha dimensão quando os grupos sociais de baixa renda passam a ser a parcela mais expressiva do fluxo turístico para Mosqueiro.

O conflito dessa forma estabelecido e as decorrentes estratégias de restrição de acesso e uso à orla oeste vão de encontro à caracterização de um espaço público enquanto o lugar do discurso público, pois, para tanto, a co-presença de indivíduos, de diferentes, é primordial, uma vez sendo o único meio de estabelecer o confronto de razões e a realização do debate. A comunicação entre os diferentes é possível através da intersubjetividade, isto é, do domínio de interlocução que garante o sucesso da comunicabilidade, sendo assim, “o espaço público é simultaneamente o lugar onde os problemas se apresentam, tomam forma, ganham uma dimensão pública e, simultaneamente, são resolvidos” (Gomes, 2002, p.160). Segundo Bauman (2001) a capacidade de interagir, de debater com estranhos sem utilizar essa estranheza contra eles ou atuar no sentido de eliminar características da sua estranheza é o principal qualificativo da civilidade. A renúncia a esses preceitos é vista pelo autor como uma patologia do espaço público, que terá reflexos no campo da política, entre outras coisas, por meio da decadência do princípio do diálogo e da negociação. Neste sentido, Gomes (2002, p. 164) assim se pronuncia a respeito do espaço público:

[...] um lugar de conflitos, de problematização da vida social, mas sobretudo é o terreno onde esses problemas são assinalados e significados. Por outro lado, ele é uma arena onde há debates e diálogo; por outro, é um lugar das inscrições e do reconhecimento do interesse público sobre determinadas dinâmicas e transformações da vida social. [...] Por meio desses lugares de encontro e comunicação, produz-se uma espécie de resumo físico da diversidade sócio-espacial daquela população.

A orla oeste de Mosqueiro por condensar uma grande diversidade social, tanto no que se refere às práticas turísticas (segundos residentes, excursionistas e ecoturistas) quanto aos grupos sociais locais, pode se estabelecer enquanto um espaço público na forma proposta por Gomes (2002), mas para isso, essa diversidade deve ser incentivada e não restringida, como acena o próprio Plano Diretor Urbano do Município de Belém (PMB, 1994). A implementação de restrições de uso dessa orla a determinados grupos sociais impossibilita o encontro com o outro, com o diferente e, dessa forma, aproxima o espaço da orla oeste mosqueirense da conceituação de espaço público, mas não civil. Esse tipo de espaço público inspira o respeito e a ação, consubstanciando, assim, a “tarefa de enfrentar a chance de encontrar estranhos” (Bauman, 2001, p.191), enquanto que os espaços públicos e civis reforçam a permanência e a interação. Nesse sentido, duas intervenções do governo local foram essenciais para estimular essa interação e permanência na orla oeste: a instauração da tarifa urbana e a instalação da trilha ecológica Olho D’Água, pode-se dizer que a primeira inaugurou o encontro com o estranho e a segunda tentou consolidar esse encontro.

A inauguração do encontro com o outro na orla oeste de Mosqueiro por meio da facilitação do acesso aos grupos sociais de menor poder aquisitivo da sede municipal com a instauração da tarifa urbana, impôs a essa área um debate novo sobre o seu uso turístico que até então se formatava como um espaço público mas não civil, pois esse uso se destinava basicamente a um grupo restrito de turistas: os segundos residentes, ou quando muito, a uns poucos excursionistas, cuja semelhança do estilo de vida os tornava seus iguais. A tentativa de consolidação de um espaço público civil através da instalação da trilha Olhos D’Água, remete a uma ação que visava em última análise a ‘permanência’, para retomar Bauman (2001), dos fluxos excursionistas na orla oeste, isso porque para manter os segundos residentes frequentando essa orla ao invés de simplesmente desarticular a linha rodoviária que praticava a tarifa urbana, articulou-se outros trunfos espaciais dessa localidade como atrativo turístico e, possibilitou um outro olhar do turista sobre seu espaço turístico.

Esse outro olhar do turista sobre seu espaço de vivência turística perpassa pela descoberta de que esse espaço não se restringe as praias da orla oeste, fato evidenciado no relato de vários turistas que visitam a trilha: “[...] eu nem sabia que existia isso aqui [...] quando me falavam de Mosqueiro eu só lembrava do verão, das casas de praia e da praia” (Turista de segunda residência, agosto, 2003). Nesse ínterim, a instalação de um roteiro ecoturístico nessa porção territorial de Mosqueiro engendrou mais “encontros com estranhos”, dado o fato da realidade vivida pelos grupos sociais das três localidades abarcadas pela trilha ser desconhecida da grande maioria dos belenenses que frequentam a ilha e, de que os grupos sociais dessas localidades pouco tinham relação com os fluxos turísticos da ilha e, quando tinham, se restringiam a venda do excedente da produção local de base familiar para alguns comerciantes que atendem os turistas no mercado e na feira da Vila.

Mais que isso, essa nova prática turística na orla oeste de Mosqueiro propiciou um olhar sobre o lado ribeirinho da ilha, esquecido com a desativação do transporte fluvial, e que a utilização do trapiche da Vila e do porto Pelé como objetos espaciais essenciais ao uso turístico desse lado da ilha trouxe a tona, um lado em que as pessoas usam canoas para ir a escola, aos postos médicos etc. A consequência desse uso turístico repercutiu sobre os fluxos de ecoturistas vindos de outros países a Belém, principalmente alemães, que passaram a visitar a orla oeste de Mosqueiro no percurso da trilha, imprimindo mais uma territorialidade à área, nesse sentido, como assesta Haesbaert (2004, p.350) o mais importante na construção dessa territorialidade é o significado e a ‘funcionalidade’ que as relações daí derivantes empreendem no espaço. Nesse viés, se as relações derivantes dessa territorialidade com as demais estabelecidas na orla oeste resultarem em efetivos encontros com o diferente pode ser que essa orla constitua-se em um espaço realmente público. Entretanto, o que se observa nessa orla, fundamentalmente, por parte dos segundos residentes é a incessante busca da redução das chances de encontrar com o estranho, isso porque como aponta Arendt (1987), enquanto membros de uma sociedade esses turistas esperam “de cada um de seus membros um certo tipo de comportamento, impondo inúmeras e variadas regras, todas elas tendentes a <normalizar> os seus membros, a fazê-los <comportarem-se>, a abolir a ação espontânea ou a reação inusitada” (p. 50)

Essa busca por ‘normalizar’ a orla oeste fornece uma relevante base explicativa para a desterritorialização dos turistas de segunda residência de Mosqueiro, pois essa desterritorialização é associada a sua reterritorialização em outras localidades turísticas paraenses como a orla das praias do município de Salinopólis, ou localidades nordestinas como a orla das praias de Fortaleza, ambas redutos do turismo de massa, ou seja, com aglomeração de pessoas, com alta intensidade sonora etc., mas com “pessoas mais limpa” (Segundo residente jun. 2004). Essa recusa de interação com o diferente debilita sensivelmente a natureza da orla oeste de Mosqueiro enquanto espaço público, pois, como destaca Arendt (1987), “ser visto e ouvido por outros é importante pelo fato de que todos veem e ouvem de ângulos diferentes. É este o significado da vida pública [...]” (p.67). Segundo Gomes (2002), os espaços públicos, como a orla oeste de Mosqueiro, encarnando todas as disputas territoriais e conflitos de interesses, são condições espaciais importantíssimas e absolutamente necessárias ao ideal de liberdade, de igualdade e de um regime político que pretenda estabelecer um valor isonômico entre as pessoas, sendo, desse modo, condição e meio para o exercício da cidadania.

REFERÊNCIAS

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FONTE: Revista Rosa dos Ventos, 5(3), p. 528-544, jul.-set, 2013.