terça-feira, 27 de julho de 2010

NA ROTA DO TURISMO: NAS ONDAS DE RIO

Chegou o verão! Ou deveria dizer estiagem?! Época em que chove menos: quase todo dia, mas não o dia todo?! Talvez isso! Afinal, estamos na rota da chuva e chuva da tarde aqui não é lenda nem catástrofe, é bênção dos Céus: vem para aplacar o calor e vai embora. Nesta época, chove sim, principalmente se é de lua a maré, e quando chove, é muita água com vento, raios e trovoadas capaz de lavar a ilha toda e a alma de todos. Mas é gostoso, porque “depois da tempestade vem a bonança” e o Sol ressurge morno ou quente, às vezes até escaldante, despertando a vida.

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Foto: Christopher Bahia                   Foto: Christopher Bahia

E tudo é movimento frenético na busca do conhecer, do lazer, do prazer. Mosqueiro quase esbarra na linha do Equador e suas águas cálidas e doces de rio amazônico banham bronzeados corpos bonitos expostos sensualmente, que os reduzidos e vistosos trajes de praia não conseguem esconder.

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Foto: Gerlei                                         Foto: Gerlei

É verão e os ventos do Atlântico começam a soprar forte sobre as baías que nos cercam, sobre o “mar dulce” do Pinzón, encapelando as ondas da maré de enchente, as quais rugem na arrebentação em torrentes de espumas. São dezoito quilômetros de praias de água doce com ondas – a maior extensão no mundo todo – e há mais de cem anos, os veranistas belenenses, embora os europeus tenham iniciado o costume, buscam este recanto paradisíaco nas férias escolares. No passado, procuravam descanso e tranquilidade. Mas os tempos mudaram: agora, tudo são cores, sabores e agitos e, sem dúvida, o turismo de sol e praia predomina.

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Foto: Gerlei                                          Foto: Gerlei

O que não falta é animação: o vai-e-vem de carros e banhistas, o multicolorido dos guarda-sóis fincados na areia e das pipas bailando no céu, a movimentação dos vendedores, a preocupação do pessoal da assistência e da segurança, a alegria de crianças e jovens e muito som, som alto do tecnobrega e do forró “arretado” brotando das barracas de praia, das malas dos carros transformadas em potentes aparelhagens e dos trios elétricos que percorrem a orla arrastando multidões. Tudo isso, reflexo de uma ligeira fuga dos grilhões do cotidiano, às vezes liberdade excessiva que conduz às mazelas do nosso tempo. Mas é verão e o cenário é lindo: belezas naturais fantásticas, atraentes e carregadas de magia!

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Foto: Gerlei                                       Foto: Gerlei

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Foto: Gerlei                                         Foto: Christopher Bahia

segunda-feira, 26 de julho de 2010

JANELAS DO TEMPO: O TESOURO DOS CABANOS

(Transcrição de autoria do Prof. Alcir Rodrigues)

2.2.2 Transcrição da narrativa oral do Sr. José Bentes Bahia (Popularmente o Brôa, já Falecido)

Em meio a uma conversa informal, na sua propriedade, bem na beira de um igarapé (chamado de Tamanduaquara) o entrevistado, entre outras histórias, umas sobrenaturais, outras relatando fatos do cotidiano de outrora, algumas jocosas, relatou-nos esta:

Se eu for te contar história, meu irmão, é o dia inteirinho te contando história daqui do Mosqueiro. Tem história bonita e tem história feia.

Esse negócio de achar dinheiro, isso não é mentira, não. O pessoal já acharam muito dinheiro. Porque no livro mesmo diz que a maior fortuna tá enterrada na Baía do Sol, dos cabanos, que aqui tinha o maior forte cabano. a maior. soldado, exército. O Angelim que veio pra cá, o Eduardo Nogueira Angelim, ficou na Baía do Sol, né. Então, lá eles fizeram a camboa. Tem camboa na Baía do Sol que fica a cobra grande, entendeu? Tem até hoje.

Então, lá que eles conseguiram sustentar, né. Tinha 4 mil homens. Quando eles fracassavam em Belém, que eles saía daqui, eles ganhavam a guerra em Belém. Tinha muita gente, soldado.

Então diziam que aqui tá todo o dinheiro, dinheiro vivo. Diz que aqui tá todo o dinheiro enterrado da cabanagem, que eles pegavam todo o dinheiro dos caras, tomavam o dinheiro.

Inclusive, tem uma história do velho Ângelo, do velho Ângelo da Baía do Sol, pai do Beca. Tinha um preto que ficava lá dentro da taberna dele, (.) com ele. Tinha uma parte que vendia peixe que só, peixe. Tinha peixe salgado, que ele mandava praí pro Moju, pra trocar com farinha, milho. Encheu canoa pra lá. E tinha um cupuaçuzar lá, tem um cupuaçuzar. Aí ele pegou e disse pro preto assim:

Preto chamou lá o nome do preto vai roçar, vai cair cupuaçu, vai logo roçar lá debaixo do cupuaçuzeiro, pra quando começar a cair não dar trabalho.

Aí o cara pegou o terçado e saiu pra lá, e ainda levou o filhozinho dele. Aí, tinha umas árvores dentro do mato. Ele pegou e disse assim:

Vai lá naquelas árvores lá.

Aí, quando ele viu, o preto velho, o moleque chegou com o pote.

Olhe, pai, esse pote que eu achei no cupuaçuzeiro.

Aí, o velho disse assim:

O que deixaram aí nesse pote? Destampa.

Destampou o pote. Tava cheio de moeda de ouro. Era grego. Que naquela época era libra, libra esterlina, né, libra. Era em grego, italiana, né? Aí ele pegou, botou a porra do pote no ombro. Chegou lá, entrou pelo lado assim, que era separado o peixe, era separado do comércio. Aí, ele botou o pote em cima da banca lá. Aí, chegou lá. O velho Ângelo, ele tomava uma cachaça, o velho Ângelo também tomava uma; tomava uma, ele tomava uma.

Aí, ele pegou o velho Ângelo assim pelo braço e disse:

Olha, português filha da puta, tu deixa de sacanagem comigo, viu? O preto velho dizendo pro velho Ângelo.

Aí ele:

Por que, já?! Que é?!

Vem cá.

Ele se levanta, chega:

Olha lá, vê, foste bota, foste bota o pote cheio de dinheiro lá, pensando que eu sou ladrão. Eu não sou ladrão. Te manca comigo! Te manca comigo, português, viu? Te manca comigo!

Aí, o velho Ângelo disse pra ele:

É. Agora eu to satisfeito, que deu pra ver que tu não é ladrão. Vai botar isso debaixo da cama.

Ele pegou e foi botar debaixo da cama. O filho do preto é que tirou uma moeda, entendeu? Ele usava, usava diz que lá na Baía do Sol, usava com um fio amarrado no pescoço, a moeda.

Pra tu ver. Aí que o velho Ângelo ficou rico demais, ficou. Essa história todo mundo conta lá na Baía do Sol. Não sou eu, não.

Tem enes histórias que tem no Mosqueiro. Eu te falei outro dia que não tá fazendo 10 anos, não tá fazendo 10 anos, o cara achou aqui no Mari-Mariaçu? Já ouviste contar essa?

Não.

Palavra! Tá ali! Se tu quiser entrevistar o cara, tu vai. Tá vivo o cara! Olha, é mais ou menos assim. Eu não sei bem como é a história. Mas é mais ou menos. Uma vez fui pegar tucunaré, que lá tem muito tucunaré, tem uma mangueira...

E, com uma expressividade contagiante, seu José quase não me deixava partir para casa, de tanta história que conhece e queria me contar.”

(Rodrigues, A. de V. A.: Narrativas Orais da Ilha de Mosqueiro. Ebah.com. Acesso em 22 de jul/2010, disponível em URL: http: //www.ebah.com.br/ narrativas-orais-da-ilha-de-mosqueiro-memoria-e-significado – doc- a 17099. Html).

MOSQUEIRANDO: Fomos atrás do dinheiro dos cabanos e não o encontramos. Achamos, porém – e isto deve interessar aos colecionadores – algumas moedas antigas que circularam na ilha, na época do Império e nos primeiros tempos da República.

Moedas dos tempos do Império:

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Moedas dos primeiros tempos da República:

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quarta-feira, 14 de julho de 2010

JANELAS DO TEMPO: SÃO PEDRO DO AREIÃO

 

Manhã ensolarada de sábado, 29 de junho de 1.918. Em fila, canoas a vela embandeiradas singram as águas da baía de Santo Antônio, onde há quatrocentos anos os índios morobiras pescavam em suas igarités.

As embarcações ornamentadas para a festa, umas da Vila e outras vindas do Marajó, impulsionadas pelo vento e pela maré de enchente, aproximam-se velozes das fartas areias que os pescadores, desde tempos remotos, chamam de Areião. Na enseada formada pela Ponta da Pedreira, antiga Ponta da Musqueira, compondo a exuberante paisagem tropical, a praia expõe sua beleza selvagem nos diversos tons da verdejante mata, na qual sobressaem algumas humildes casas de madeira.

Desde cedo, atraida pelo foguetório, grande parte da população da Vila está na praia aguardando a procissão fluvial, uma novidade nestas paragens. Ainda no despertar da manhã, os pescadores e suas famílias haviam levantado o Mastro envolto em folhagem e decorado com uma variedade de frutos, sinalizando o início da festa e simbolizando, além da fertilidade da terra, as varas que os pescadores conduzem nos ombros para transportar os peixes arrumados em cambadas. O Mastro é uma espécie de agradecimento ao Santo Padroeiro pelos frutos da terra e do mar.

À sombra da imensa mangueira, Dona Izabel Magalhães, matriarca da família Palheta, ladeada pelas senhoras Izaura Magalhães e Helena Magalhães, olha ansiosa as águas do rio-mar, vislumbrando os esperados barcos. E eles vêm garbosos e multicoloridos, contrastando com o azul do céu e parecendo saltitar sobre as ondas. No comando, a canoa maior e mais vistosa trazendo em sua proa o quadro de São Pedro enlaçado por fitas coloridas, doação de uma família portuguesa residente na Vila. Dona Izabel lembra que, ainda no dia dois, reunira-se com o Sr. Luiz de Oliveira e os pescadores para decidirem sobre a festa. Ali, a pesca artesanal era uma atividade milenar e isso justificava a homenagem ao Santo.

A canoa embica na areia encharcada onde quebram as ondas. Pés firmes afundam no raso das águas e mãos calejadas retiram cuidadosamente o Santo de sua devoção. Trajado em sua simplicidade de homem rude, um pescador conduz o quadro até o altar preparado para a missa campal. Foguetes estouram saudando a chegada e o povo aplaude com entusiasmo.

Na missa, o Padre Florêncio Dubois fala do Pescador de Peixes que Cristo transformou em Pescador de Homens para a Sua Doutrina e sustentáculo para a Sua Igreja, fala dos perigos da pesca, da coragem e da fé que movem esses homens do mar ali reunidos, contritos, demonstrando respeito, e pede a Deus proteção contra a gripe espanhola, que varre o mundo e aproxima-se do Brasil. E eles ouvem atentos e alegram-se.

Depois da missa, é hora de festejar. Nas areias da praia, os pescadores reproduzem o moqueio usado pelos morobiras assando em braseiros, entre outros peixes, enormes piraibas, para alimentarem o povo. É o momento de confraternização entre mosqueirenses e marajoaras, com o peixe no prato e a farinha na cuia. Aguardente da boa, quentão e aluá de milho animam os participantes.

No terreiro à beira da praia, começa a roda de carimbó ao som do pau-e-corda tocado por músicos locais: um bom desafio para os dançarinos! No ritmo do batuque e das palmas da assistência, as mulheres giram sensualmente as enormes saias rodadas sobre as cabeças de seus cavalheiros, que se acocoram num rebolado sincronizado. A eliminação da roda de dança acontece com os dançarinos menos ágeis, que deixam as barras das saias tocarem em seus rostos. E, assim, a brincadeira prossegue animada como o bate-papo dos amigos e comadres, a correria da criançada inventando traquinagens e o estourar de foguetes.

No cair da noite, o Mastro é derrubado, acendem-se imensas fogueiras no terreiro, em torno das quais os conhecidos se reunem, e servem-se bebidas e iguarias da época. Na alegria do encerramento, parece estar a promessa de que esta festividade se tornará tradição.

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Noventa e dois anos depois, a Festividade de São Pedro da praia do Areião é um evento tradicional do povo mosqueirense. A sede da Colônia de Pescadores Z-9, ali fundada em 1.920, foi transferida para a Baía-do-Sol, mas a homenagem ao Santo permanece fiel às suas origens. Durante todos esses anos, os Presidentes da Z-9 coordenaram a festa, destacando-se Luiz de Oliveira, Carlos Campos, Deocleciano de Deus Matos Botelho (seu Dedê), José Martins da Trindade, José da Silva Pombo, Tenente Carlos Gomes da Cunha, Tenente Pedro Menezes e Maria Diva Palheta, que também era professora da escolinha da Colônia e que, a partir de 1.961, assumiu a responsabilidade em dirigir a homenagem ao Padroeiro dos Pescadores.

Imagem de São Pedro que substituiu o quadro da 1ª Procissão Fluvial.

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Imagem de São Pedro venerada atualmente.

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CORTEJO DO MASTRO DE SÃO PEDRO DO AREIÃO – 1.998

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CORTEJO DO MASTRO DE SÃO PEDRO DO AREIÃO – 2.010

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Juizes do Mastro em 1.998 e 2.010: Claudionor Wanzeller e Alice Lameira.